No seu tradicional artigo dominical no Popular, a editora-chefe de O Popular, jornalista Cileide Alves, critica as gestões públicas no Brasil por fiarem mais nos conselhos dos marqueteiros do que no estabelecimento de políticas públicas eficientes.
Ela cita a falência de Detroit como um exemplo de que também no Brasil as administrações faliram.
Veja o artigo:
Desmarketização
Cileide Alves
Detroit, a principal cidade do Estado de Michigan, nos Estados Unidos, pediu concordata. Sede da Ford, GM e Chrysler, os motivos de sua quase falência são a desindustrialização, agravada por uma sucessão de governos desastrosos que não repensaram o planejamento urbano, um plano de desenvolvimento econômico e ainda pela corrupção que dominou várias administrações.
Consequentemente, a qualidade de vida da população caiu: a criminalidade explodiu, apenas um terço das ambulâncias está operando, os parques foram fechados e aumentou o número de jovens que, sem alternativa de renda, aderiram ao tráfico de drogas.
Esse retrato de Detroit bem que poderia passar pelo de Estados e Municípios brasileiros. Aqui, como lá, sucessivos governos não pensaram políticas públicas, não planejaram as cidades, foram dominados pela corrupção, não oferecem serviços públicos de qualidade e fecharam os olhos ao aumento da criminalidade, como o tráfico de drogas que consome nossos jovens.
Por aqui, a combinação de endividamento alto, gastos públicos exorbitantes, em especial com o custeio da máquina e com a folha de pagamento, e a baixa qualidade dos serviços públicos levou milhões de pessoas às ruas em junho, e ainda provoca inquietações em protestos menores e isolados. Quer dizer, assim como em Detroit, aqui o modelo de funcionamento dos Estados e municípios também faliu.
Detroit buscou uma saída heterodoxa para os padrões brasileiros, a contratação do advogado Kevyn Orr, que comandou o bem-sucedido plano de reestruturação da Chrysler e é apontado nos Estados Unidos como um dos maiores especialistas em falência, para elaborar um plano emergencial, que foi o pedido de concordata.
Os governantes brasileiros, entretanto, continuam a buscar saídas apenas no marketing político e, não por acaso, são os marqueteiros que estão sentados à sua direita. Prefeitos, governadores e a presidente Dilma Rousseff, assim como deputados e senadores que comandam as casas legislativas, continuam a usar só ferramentas de marketing para gerenciar a crise que é de gestão pública e orientação política. Faltam políticas públicas eficientes e sobram ações da velha prática política clientelista e fisiológica que entregou o Estado a grupos econômicos e políticos.
A história de Detroit mostra a complexidade de gestão de crises. Passa por um competente diagnóstico da situação e a elaboração de um plano emergencial de ação. E, claro, coragem política para ministrar remédios amargos. O plano de Detroit aponta para um calote de 80% de sua dívida sem proteção, de US$ 12 bilhões. Ação radical similar no Brasil seriam cortes profundos na estrutura da máquina pública, com redução de ministérios, secretarias estaduais e municipais e corte de comissionados.
Para isso, é preciso mudar a lógica da política, voltada à imagem do governante de plantão e ao atendimento dos interesses de seu grupo. O foco deve desviar-se para o cidadão. Menos marketing pessoal, mais gestão administrativa e mais proposição e execução de políticas públicas. Isso é que é o novo em política que 76% dos goianos sonham, conforme mostrou a última pesquisa Serpes/O POPULAR.