segunda-feira , 23 dezembro 2024
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Justiça parada e nove mil homicídios sem julgamento, denuncia reportagem

A Justiça goiana está parada e mais de nove mil homicídios não vão a julgamento, denuncia reportagem-manchete do jornal OHoje, deste domingo. Veja a reportagem:

Quase 9 mil processos de homicídios sem julgamento

De cada três mortes, apenas uma tem inquérito concluído, no Estado. Processos se acumulam e Goiás tenta aumentar prazo

Catherine Moraes

Uma média de 2,5 mil homicídios é registrada anualmente em Goiás sendo que, a cada três mortes, apenas uma tem o inquérito concluído pelas delegacias, com autoria definida. Ao chegar ao Tribunal de Justiça, o caminho é ainda mais árduo, já que a média de julgamento desses processos é de 9 anos e 11 meses, segundo dados do próprio Poder Judiciário goiano. Dessa forma, pelo menos 8.890 processos de crimes contra a vida esperam por sentença em Goiás. E os problemas não são isolados. Pelo contrário, fazem parte de uma cadeia complexa, que inclui a falta de agentes, escrivães, juízes, defensoria pública e, claro, o aumento da criminalidade.

De acordo com estatísticas da Secretaria de Segurança Pública e Justiça de Goiás (SSPJ-GO), 1.984 homicídios foram registrados em 2011. No ano seguinte, as mortes subiram para 2.426, um aumento considerado de 22,27%. Em 2013, os dados dizem respeito apenas a janeiro e fevereiro, mas já somam 407 homicídios dolosos e 396 tentativas de homicídio. Estes casos englobam todo o Estado e são investigados não só pela Delegacia Estadual de Investigação de Homicídios (DIH), mas também pelos distritos policiais e delegacias do interior. Somente na capital, nos primeiros dois meses do ano, foram 91 homicídios registrados na DIH, distribuídos para nove delegados (um titular e oito adjuntos).

Processos

De 2009 até hoje, são cerca de 1.525 processos abertos, que dizem respeito a crimes dolosos, incluindo latrocínio, homicídio, tentativa de homicídio, suicídios e mortes a esclarecer. De acordo com o delegado titular, Murilo Polati, 230 inquéritos foram concluídos no ano passado. Apesar disso, ele afirma que outros 600 foram instaurados. Todo ano, o saldo “devedor” é de pelo menos 400 casos só na delegacia especializada, e essa proporção é considerada, por ele, como normal. “O número de delegados até é suficiente, o problema é que faltam escrivães e agentes”, pontua.

Abaixo da média

Para cada 100 mil habitantes, ocorrem, no Brasil, em média, 29 homicídios mensais, número superior ao da média mundial, que é 8,8, segundo informações do Ipea. Foi pensando nisso que uma mobilização do Grupo de Persecução Penal da Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (Enasp) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estabeleceu metas para o Judiciário brasileiro em julgamentos de homicídios que tramitam no País há mais de cinco anos.

O prazo terminaria no final de 2012, mas Goiás, com um total de 3.466 processos parados, julgou 876, atingiu apenas 32,92% do total. Desde então, os números aumentaram e de 2009 a 2013 já são outros 6.300

Algumas particularidades, entretanto, precisam ser levadas em consideração, como o número absoluto de processos julgados e o acervo. Juiz auxiliar da presidência do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), Carlos Magno reconhece que o índice goiano foi baixo, mas pede uma análise mais profunda. “Nós julgamos 876 processos e, se olharmos o número absoluto de processos julgados, estamos na sétima colocação. Quando o assunto é número de acervo, com total de processos, entretanto, Goiás fica em terceiro lugar”, completa.

No Estado, são 12 as comarcas mais preocupantes, que concentram 50,5% do número pendente de processos: Goiânia, Anápolis, Aparecida de Goiânia, Rio Verde, Novo Gama, Luziânia, Formosa, Goianésia, Jataí, Trindade, Valparaíso e Planaltina de Goiás.

Faltam juízes

O juiz Carlos Magno afirma que o Tribunal de Justiça goia­no reconhece a falta de 102 juízes titulares e 50 substitutos nas comarcas do Estado. A situação não é recente. No início de março, 354 candidatos concorreram a 34 vagas do 55º Concurso da Magistratura.

Carência de defensoria pública no interior

Apesar do baixo índice na meta do Grupo de Persecução Penal da Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (Enasp), Goiás chegou a realizar até cem júris em uma única semana, em cidades como Anápolis e Goiânia, por meio de mutirões. Nestes casos, entretanto, encontrou problemas porque o interior de Goiás não possui defensoria pública. “Os advogados trabalham de forma voluntária em acordo firmado com a OAB-GO. O governador está autorizando um novo concurso para a defensoria e isso também será muito bom para o Poder Judiciário”, disse.

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil Seção Goiás (OAB-GO), Henrique Tibúrcio, explica que, “nos locais onde não há defensoria pública, o juiz tem o poder de nomear um advogado que defende o caso e, no final do processo, são determinadas as Unidades de Honorários Dativos (UHD) a serem pagas pelo Estado. Eu não poderia dizer, entretanto, que a falta de defensoria pública é o maior dos problemas porque existe a advocacia dativa, mas isso pode ser melhorado”, completa.

Entre os problemas dos UHDs estão: a baixa remuneração e os atrasos, confirmados inclusive por Tibúrcio. O valor é baixo, chegando a 300 reais pelo processo, uma tabela de 80 reais por UHD. Segundo o presidente da Ordem, a promessa ainda não cumprida da Procuradoria-Geral do Estado é que esse valor suba para 126 reais. “Nossa conversação é com a Procuradoria-Geral do Estado e acredito que em breve a negociação seja firmada”, acredita.

Ele conta ainda que o Estado atrasou alguns pagamentos e a OAB-GO teve de realizar um acordo para regularização desse débito. “Ainda assim, não acredito que advogados do interior tenham se recusado a atuar em caso de serem convocados. Isso pode estar acontecendo, mas, com certeza, é exceção”, diz. (C.M.)

Goiás quer mais tempo para metas

Reconhecendo o desempenho aquém do necessário e em busca de melhor atuação, o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) propôs ao Enasp que o prazo de mutirão de julgamentos seja prorrogado até junho de 2014. “Prova de que reconhecemos é que por proposta do tribunal, juntamente com a Secretaria de Gestão e Planejamento, o prazo para cumprimento da meta será estendido. O presidente, Ney Teles, inclusive já autorizou recursos”, afirma o juiz-auxiliar da presidência, Carlos Magno.

Segundo ele, a ideia agora é criar um grupo gestor que conte com integrantes da informática, diretoria, presidência, núcleo de apoio ao magistrado do interior e também da corregedoria do TJGO. “O fato é que o Enasp vai nos dar um novo prazo e, com o vento soprando a nosso favor, com um plano mais aplicado e verba também acredito que antes de o prazo zerar nós teremos concluído esse arquivo de processos”, garante. (C.M.)