Nion Albernaz, ex-prefeito de Goiânia e presidente do Conselho de Excelência dos Hospitais, escreve artigo no Diário da Manhã no qual aborda a compra de medicamentos sem licitação por parte da Secretaria de Saúde.
Texto faz uma defesa consistente sobre a decisão e ressalta o excesso de burocracia em casos em que a vida está em jogo.
Leia o artigo:
A saúde está acima das ideologias e da burocracia
Diário da Manhã
Nion Albernaz
Quando soube que o secretário de saúde de Goiás Antonio Faleiros pode vir a ser denunciado pelo crime de salvar vidas, lembrei-me de uma história que ilustra o espírito público desse homem que é, a meu ver, um dos melhores auxiliares do Governador Marconi Perillo. Há mais de 20 anos, quando nosso Estado era administrado pelo saudoso Henrique Santillo, Faleiros ocupava o cargo de secretário de saúde pela primeira vez e decidiu conhecer a saúde pública de um País então aclamado pela qualidade do atendimento prestado, principalmente, aos mais carentes: Cuba.
A nação caribenha desperta amor e ódio desde a década de 60, mas Faleiros não se deixou influenciar pelos debates acalorados e observou atentamente o programa Médico da Família. Reconheceu os méritos e o colocou em prática no Estado de Goiás. A experiência, apesar de extremamente positiva, foi deixada de lado e só foi resgatada, aperfeiçoada e rebatizada, anos depois, pelo então ministro da saúde José Serra. Surgia no Brasil o Programa Saúde da Família (PSF).
Achei importante contar essa história para ilustrar o quanto Antonio Faleiros pode quebrar protocolos e romper paradigmas para fazer o que considera correto. Quando ouviu dos diretores dos principais hospitais públicos do Estado pedidos de fechamento das unidades, ele achou que o certo a fazer era salvar vidas. O Fundo Rotativo, que foi tão bem utilizado em inúmeras ocasiões, estava sob suspeita, sendo alvo de uma investigação do Ministério Público e da Polícia Civil. Faleiros apoiou a investigação mas ficou sem uma alternativa rápida e eficiente para adquirir insumos.
A burocracia foi criada com a melhor das intenções: controlar o dinheiro público e evitar mau uso e desperdício. Os excessos acabaram por desvirtuar a natureza da burocracia e acabaram por transformá-la em algo monstruoso, capaz até de ceifar vidas. Contaminada pela vaidade humana, a burocracia se alimenta de egos que não conseguem resistir à tentação de exercer seus pequenos poderes e, de instância em instância, sempre tem alguém querendo ser o responsável pelo carimbo indispensável, pela assinatura imprescindível, pela liberação salvadora. Um é mais importante que o outro e todos são igualmente insensíveis.
Faleiros não compactuou com essa cultura emperrada, mesquinha e vaidosa que, muitas vezes, cria dificuldades para vender facilidades. Ele é um homem de metas e objetivos, para qual missão dada é missão cumprida, e a missão a ele atribuída pelo governador Marconi Perillo foi a de tornar a saúde pública em Goiás uma referência para o País.
Há um clichê que diz que não é possível fazer uma omelete sem quebrar os ovos; outro diz que toda mudança sofre rejeição, pois afeta a zona de conforto. A compra direta e a parceria com as organizações sociais romperam paradigmas e obrigaram a sociedade a lançar um novo olhar para a saúde pública em Goiás. Os críticos se recusam e enxergar as melhorias e a satisfação crescente dos usuários, que não podem esperar 500 dias por um medicamento.
Faleiros comprou sim, sem licitação, e o fez consciente de que poderia responder, judicialmente, pelo ato. Entre ser culpado aos olhos da lei e culpado perante a própria consciência, escolheu dormir tranquilo, com a certeza de que optou pela vida.
(Nion Albernaz, ex-prefeito de Goiânia e presidente do Conselho de Excelência dos Hospitais)