Veja matéria do site do Jornal Opção:
Delegacia de Meio Ambiente questiona parte do programa Macambira-Anicuns em inquérito
Delegado alega que projeto do parque nas proximidades da Cidade Empresarial pode matar nascente de córrego tida como a mais bonita de Goiânia. Coordenação do Puama contesta se realmente se trata de uma fonte de água e alega que município não tem recursos para alterações
Ketllyn Fernandes
Iniciadas no primeiro semestre de 2012 e paradas em setembro do mesmo ano por conta do abandono da empreiteira vencedora da primeira licitação, as obras do Programa Urbano Ambiental Macambira Anicuns (Puama) podem vir a enfrentar novo impasse antes de serem retomadas este ano. Desta vez a dificuldade é relativa à incerteza quanto a possibilidade de atingir ou não a primeira nascente do córrego Cedro no caso da construção de uma rua sob a fonte. A área em questão fica localizada nas proximidades da Avenida Rio Verde pouco depois da entrada na Cidade Empresarial.
Nesta quinta-feira (23/1) o titular da Delegacia Estadual de Meio Ambiente (Dema), delegado Luziano de Carvalho, juntamente com uma equipe formada por peritos da Polícia Técnico-Científica, realizou uma perícia a fim de constatar a possível inviabilidade de execução desta parte do Puama, que é dividido em 11 etapas. A iniciativa faz parte de inquérito aberto há 2 anos pela Dema.
“Onde nós estamos aqui para fazer a perícia é para mostrar que neste local, em que foi projetado fazer uma rua, vai acabar em cima de uma nascente, além de ter nessa área um loteamento com lotes à venda apesar de ter uma cobertura natural muito boa. Nosso objetivo é que o Parque Macambira não venha a dar continuidade a esta rua aqui por conta dos danos ambientais. E esta é uma previsão real, uma prevenção”, disse ao Jornal Opção Online Luziano de Carvalho, ressaltando que estava acompanhado dos “melhores peritos do país”.
A afirmação do delegado quanto à qualificação dos peritos faz referência à devolução por parte do Ministério Público de Goiás (MPGO) do inquérito à Dema com a solicitação de que fosse realizada uma perícia que constatasse o suposto dano ambiental, pois o documento não continha tal estudo. Na avaliação da coordenação do Puama, não há certeza se de fato se trata de uma fonte, como disse à reportagem o secretário Extraordinário do Programa Urbano Ambiental Macambira Anicuns, Denício Trindade.
“Quando eu assumi o projeto, em 1º de fevereiro, já havia esse inquérito lá na Dema com relação ao questionamento da execução de obra na Rua Hélio França, que tem um loteamento que foi aprovado dentro das condições da época, em 1982. Então o sistema viário foi aprovado pelo município e o projeto [do Puama] foi desenvolvido em cima daquele que existia”, explicou, ressaltando que mudanças a essa altura acarretarão em custos que o município não tem como arcar, como no caso das desafetações.
Segundo Denício Trindade, diante do inquérito da Dema, sua pasta, ainda na gestão de Valdi Camárcio, começou a tomar providências com vistas a saber se de fato a nascente seria atingida e se realmente se tratava de uma fonte. De acordo com o secretário, no inquérito da Dema a constatação da existência da nascente foi feita por pessoas que não detêm o conhecimento técnico especifico. “Quando à existência deste inquérito, nós tomamos as providências para envolver o Ministério Público a fim de saber se existia um laudo, porque dentro do inquérito, algumas pessoas afirmaram que era nascente, mas na verdade não tinham o conhecimento em sua formação para confirmar que seria realmente uma nascente”, alegou.
Dentre as solicitações do MP está o estudo da importância da construção dessa rua para aquela região, o que foi confirmado, conforme o secretário, porque se trata de uma área que é fundamental para o sistema viário local. Foi acordado ainda entre o MP e a Agência Municipal de Meio Ambiente (Amma) que seria solicitado um laudo geológico a ser feito por um profissional da área para manifestar se de fato é uma fonte ou fruto do acumulo de água em período chuvoso por se tratar de um local permeável.
“O adensamento de água, dependendo da intensidade das chuvas no período chuvoso, pode surgir em vários locais permeáveis. Então, por conta dessa possibilidade, nós desconfiamos que lá pudesse não ser uma nascente. Partindo de todo esse estudo, foi feito o laudo solicitado pelo MP por um profissional capacitado e reconhecido pelo Crea [Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Goiás]”, relata Denício.
O laudo foi então encaminhado para a Amma e dentro desse período o secretário afirma que foi descoberto que a Prefeitura de Aparecida de Goiânia solicitou uma autorização para que se fizesse uma rede de captação pluri fluvial direcionada para dentro daquela região, que no período chuvoso sofria com alagamentos. “Ali, próximo ao atacadão da Avenida Rio Verde, sempre estava alagando no período de chuvas e agora isso não acontece mais. Mas essa água que vai para dentro da terra tem que sair em algum lugar, então ela pode estar aflorando nesse ponto em que se suspeita que seja uma nascente”, cogitou.
Para o delegado Luziano de Carvalho, não restam dúvidas de que seja uma fonte. Ele afirmou que se trata de uma das nascentes mais bonitas de Goiânia. A ação de hoje da Dema se deve à possibilidade de as obras ao serem reiniciadas, começarem justamente naquele ponto.
Denício Trindade, embora ressalte que é muito grande a possibilidade de não ser uma nascente, pondera que se for, o projeto do Macambira-Anicuns acabaria sofrendo alterações, que por sua vez podem vir a resultar em altos custos aos cofres municipais –– pois o Puama, estimado em US$ 94 milhões, será custeado 60% pelo Banco Interamericano do Desenvolvimento (BID) e 40% pela Prefeitura de Goiânia. A parte a ser financiada pelo BID já está definida.
O secretário afirma que estudos sobre a possibilidade de determinadas alterações foram feitos e, neste caso específico, os gastos seriam de mais de R$ 20 milhões apenas com desafetações. “É preciso deixar claro que, acima de qualquer coisa, o Parque Macambira é uma obra ambiental, ou seja, o propósito de se construir um parque de 24 quilômetros que vai atender a região metropolitana de Goiânia não tem relação com a iniciativa privada, é uma obra municipal, financiada pelo BID, que é bastante exigente. Às vezes, uma obra dessas, não que vá ocorrer isso, mas pode vir a afetar alguma coisa”, analisou, comparando com casos de construção de rodovias, “que para não onerar, às vezes prejudica o meio ambiente, mas como uma medida de compensação”.
Questionado sobre prazos para a entrega do laudo, Denício Trindade afirmou que na última quarta-feira (22) solicitou ao secretário de obras da Prefeitura de Aparecida de Goiânia que verifique se há esse projeto que resultou na rede de captação pluri fluvial, para apurar as responsabilidades. O responsável pelo Puama se diz preocupado com a possibilidade de ter que ser alterado o projeto do parque, pois a região pode deixar de ser contemplada por falta de recursos.
Breve histórico do Puama
Idealizado em 2003 pelo então prefeito de Goiânia, Pedro Wilson (PT), o projeto visa a revolução urbana na capital, já que prevê a solução de problemas ambientais resultantes da ocupação desordenada do espaço urbano do município. A previsão inicial era de que em cinco anos as obras fossem finalizadas por completo –– o que pode não ocorrer por conta da desistência da primeira empresa licitada.
Trata-se de uma obra que atingirá 131 bairros de Goiânia, englobando as regiões Oeste, Noroeste e Norte, por meio de projetos interligados que se estenderão por aproximadamente 30 km. Estima-se que cerca de 3.500 moradores da região central serão beneficiados com a criação de áreas de lazer, como parques, áreas de recreação, sala de esculturas, pistas de caminhada, dez travessias para pedestres e ciclistas, além dos núcleos de “Estar”, que serão uma espécie de área de convivência, com banheiros, mesas e bancos.
Também consta no projeto a construção de aproximadamente 260 unidades habitacionais, que acomodarão famílias que vivem em áreas públicas ou de risco, próximas ao Ribeirão Anicuns e ao Córrego Macambira. Esses dois rios banham 70% da área urbana de Goiânia e correspondem à bacia hidrográfica mais importante localizada na capital.