Nas próximas semanas, será divulgado o relatório final da correição levada a cabo pelo ministro Luis Felipe Salomão, ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e corregedor nacional de Justiça. No Paraná, os alvos são os excessos da Lava Jato e seus protagonistas, e, no Rio Grande do Sul o TRF-4, que agiu com incrível conivência com a midiática operação comandada por Sergio Moro e Deltan Dallagnol.
Luis Felipe Salomão é magistrado conhecido por ser homem discreto, profundo conhecedor das leis, de trato afável e educado, mas inflexível com irregularidades no poder judiciário. É a opinião unânime de seus colegas, do meio jurídico e dos jornalistas que cobrem a área e estão acompanhando sua minuciosa investigação.
Em Curitiba, a ex-poderosa juíza Gabriela Hardt, depois de uma audiência reservada com o ministro Salomão, deixou a sala chorando copiosamente pelos corredores onde desfilava e não só não cumprimentava as pessoas, como não respondia a qualquer “bom dia” ou “boa tarde”.
Num passado bem recente, ela simplesmente copiava e colava as sentenças anteriores do seu amigo Sergio Moro. Em audiência com o hoje presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ela o ameaçou publicamente. Hoje, é um fantasma nos tribunais curitibanos. Seu pai é investigado por corrupção administrativa. Trata-se de uma piada pronta: Jorge Hardt Filho é suspeito de roubar segredos tecnológicos da Petrobras e vendê-los para Marrocos, Estados Unidos e Jordânia.
O ex-presidente do TRF-4, o desembargador Carlos Eduardo Thompson Flores, outro lavajatista, deverá ser aposentado. Uma saída honrosa, segundo fontes do Conselho Nacional de Justiça, o poderoso CNJ.
Nos tempos áureos da Lava Jato, o desembargador, impecável no vestir e de trato bastante antipático, fazia uma exigência aos repórteres das emissoras de TV e aos fotógrafos: dar a entrevista ou ser fotografado ao lado de um velho quadro onde está retratado seu trisavô, Thomaz Thompson Flores, “o coronel que matou Antônio Conselheiro”, segundo sempre explicava com indisfarçável orgulho. Antônio Conselheiro, segundo dez de dez grandes historiadores, morreu de inanição durante o violento cerco a Canudos.
As mesmas fontes afirmam que, mesmo sendo conduzida por um magistrado de notório equilíbrio como o ministro Salomão, o resultado final, expresso em grande e minucioso relatório deverá ser nada menos que “uma bomba de nêutrons”, aquela que preserva as construções físicas e aniquila as pessoas. A conferir.
O próximo alvo é uma unanimidade em Brasília. Depois que magistrados foram presos na Bahia e que três ilustres desembargadores do Tribunal de Justiça de Pernambuco desfilaram com tornozeleiras eletrônicas por debaixo de suas togas, a vez é do Maranhão.
Apesar do fim melancólico da oligarquia Sarney no comando político do Estado, ainda persistem enclaves da família na máquina judiciária estadual. E a atuação nada discreta e as práticas dos juízes “sarneystas” chamou a atenção do CNJ.
A era Sarney levou o Maranhão a apresentar indicadores sócio-econômicos, de saúde e de educação, principalmente, iguais aos do Haiti, um dos países mais miseráveis do mundo. A mudança foi iniciada com as expressivas duas vitórias de Flávio Dino para o governo estadual.
O hoje ministro-estrela do governo Lula, respeitado juiz federal, iniciou profundas mudanças na estrutura do governo e nas relações de poder com a sociedade. O “sarneysismo” caiu como um castelo de areia na praia do Calhau.
Há um revezamento corriqueiro entre os ministros dos tribunais superiores, em Brasília, e os desembargadores nos tribunais dos estados. O mais velho assume a presidência e será sucedido pelo segundo mais velho na casa, que passará o bastão ao terceiro com maior tempo na casa, e, assim sendo, todos os ministros e desembargadores terão a chance de ocupar a chefia.
É uma prática democrática, descentralizadora e que oxigena o ambiente de trabalho e renova o modus operandi, em geral com evidentes ganhos para o funcionamento do aparato judiciário.
Quando chegou a vez da desembargadora Nelma Sarney, incrivelmente, a maioria de seus colegas se recusaram a entregar o comando do Tribunal de Justiça do Maranhão à cunhada do ex-presidente José Sarney.
Ela foi impedida de exercer a presidência justamente na vez que lhe cabia. O Maranhão tremeu, mas já era um sinal eloquente da decadência da dinastia Sarney e a chegada de novos tempos no paupérrimo estado governado por meio século pelo ex-presidente, por sua filha Roseana, por apaniguados e compadres. Meio século de poder absoluto.
O mesmo corregedor ministro LuisFelipe Salomão comandou investigação rigorosa que apontou um superfaturamento de mais de R$ 130 milhões na construção do novo Fórum de Imperatriz, a segunda maior cidade maranhense e importante polo econômico. O autor da proeza, segundo processo no CNJ, teria sido o polêmico desembargador Guerreiro Júnior. A aposentadoria compulsória seria exigência imediata do austero ministro Salomão.
Em fevereiro circulou a representação acusando o superfaturamento de Imperatriz. Desde então as investigações da Corregedoria do CNJ não tiveram interrupção. A representação com os gastos e desvios da obra comandado pela gestão do desembargador Guerreiro deverá ser a Waterloo de sua polêmica carreira.
As batalhas de Guerreiro não param por aí. Um influente assessor de seu gabinete, identificado em documento reservado do CNJ pelas iniciais L. G. A. F., exibiria sinais exteriores de riqueza incompatíveis com o salário de um simples servidor da justiça.
Além de desfilar pela capital São Luiz num reluzente Porsche, automóvel que custa a bagatela de R$ 840 mil, tal funcionário aparece na Junta Comercial como sócio de várias e bem-sucedidas empresas. Um detalhe curioso, talvez revelador, é que a maioria delas é de construtoras. Ah! Em tempo: o Porsche do “operador” circula sem placa de identificação.
Na turma que manda no que restou do antigo poder da oligarquia Sarney no Tribunal de Justiça do Maranhão, tanto pode se topar pelos corredores com o famoso advogado Elias Lago, de família tradicionalíssima, quanto com o exitoso advogado Ronaldo Henrique dos Santos Ribeiro.
Dono de influente banca de advocacia e figura onipresente nos processos mais polêmicos, o Dr. Ronaldo já teve sua inscrição na OAB suspensa, foi acusado de traficar influência e responde a caudaloso processo que corre em 2º grau no TRF-1.
Um desembargador do TJMA, ouvido sob compromisso da não publicação de seu nome, lembrou que “a cada visitinha do CNJ dois juízes se aposentam e vão gozar das delícias do nosso belo litoral”. Em tom menos irônico, ele foi taxativo: “é a luta da maioria séria do judiciário maranhense que cansou de ser confundida com a minoria absoluta, mas que não tem limites e pouco se importa com a fama pública que tem. Existe um câncer na justiça do Maranhão e esperamos que o ministro Luis Felipe Salomão o extirpe”.