domingo , 24 novembro 2024
GoiâniaImprensa

Jornalista escreve artigo em que fala do machismo homossexual

Veja a artigo do repórter do site A Redação, Alexandre Parrode:

Gay macho alfa

Esculacho ao machismo homossexual
Goiânia – Não tem nada pior que “gay que não é gay”. Passam-se os anos, conquistam-se direitos e parece que uma parcela da sociedade não evolui. Pior, alguns gays – me atenho à definição de homens que têm atração por outros homens – parecem não acompanhar o desenvolvimento social.

É comum vermos, principalmente em boates, grupos de amigos e nos aplicativos voltados para o público, gays que se definem como “macho de verdade”. Eu realmente não entendo o que isso quer dizer. Os “gays machos alfa” (assim gosto de chamá-los) se consideram “discretos” e “sigilosos”. São aqueles que “não se parecem com gays”. Aqueles que as pessoas ficam “chocadas” quando alguém diz: “ele gosta é de homem”.

Os “gays machos alfa” enchem o peito e contam vantagem por “não darem pinta”, ou seja, se vangloriam por se passarem por “héteros” – como se isso fosse algum tipo de vantagem. Inclusive, são os primeiros a criticar e “odiar” outros gays que, por eles, definidos com os mais sortidos (e sórdidos) adjetivos, como “feminina”, “bichinha voz de pato”, “mulherzinha” e por aí vai…

Escrevo o texto não como uma “ode à pinta”, mas sim como um “esculacho ao machismo gay”.

Ora, me parece que já há algum tempo a homossexualidade deixou de ser um tabu social e passou a ser uma realidade. Aqui em Goiânia – na minha eterna e amada “roça asfaltada” – ainda não é comum ver casais do mesmo sexo andando de mãos dadas e/ou trocando carinhos em locais públicos. Ainda é chocante para a “elite bovina” ver tais demonstrações de afeto. Mas em grandes centros mundo afora, isso não é nenhuma novidade.

Só que, o que acontece – e, neste ponto, digo que não é só em Goiás – é o preconceito entre os próprios homossexuais. Existe um machismo criado entre gays que dita que o atraente, o masculino, o padrão sexual é um gay sem trejeitos, sem maneirismos, com postura firme e, como também no mundo hétero, musculoso, forte e viril.

Já vi vários amigos serem dispensados e tachados porque dão pinta ou se divertem com perucas, usando maquiagem ou, mais extremo, se vestem de mulher em determinada festa ou evento.

No mundo dos gays machos alfa, o interesse sexual só vai ao encontro de outros gays machos alfa. Certa vez escutei um rapaz, que está sempre drogado e bêbado, com camisas justas exibindo sua aparente boa forma nas boates héteros de Goiânia, dizendo: “que me desculpem as bichinhas, mas eu gosto é de macho”.

Fiquei pensando naquilo… Talvez ele até tenha razão. Quando se pensa em um homem (ou mulher) atraente o que vem à mente são os padrões de beleza da sociedade moderna. No quesito fetiche ou desejo sexual, o que vale é mesmo o exterior.

Talvez valha a pena para uma “foda”. O machão, com músculos e testosterona (leia-se hormônios) pungentes, realmente são mais atraentes e encaixam melhor nos padrões atuais. Quiçá te proporcionem mais prazer… Só que, no fim do dia, o gay macho alfa volta para o armário, tranca a porta e esconde a chave, renegando qualquer sentimento ou desejo que tenha. E assim vivem eles, escondidos e mal resolvidos, numa vida de negação eterna. Os gays machos alfa têm sexo garantido toda semana, mas o tempo castiga.

Minha avó sempre me disse “um dia você também será velho”. E eu gosto muito de pensar que sim, um dia eu serei velho. E quero chegar à velhice ao lado de uma pessoa que me respeite, que divida os mesmos valores que eu, que me ame por quem eu sou de verdade, que esteja ao meu lado não importa o que aconteça e que, acima de tudo, tenha orgulho de estar comigo.

Pode parecer clichê, pode soar como dor de cotovelo e até recalque. Mas de uma coisa eu tenho certeza. O gay macho alfa não consegue nem sequer se respeitar. Não se aceita, nega o seu próprio desejo e se afugenta.

O gay macho alfa, este sim é recalcado. Morre de inveja dos gays bem resolvidos, que não têm vergonha em sair às ruas de mãos dadas, de trocar beijos apaixonados como qualquer casal. Morre de inveja dos gays que defendem o respeito, o casamento igualitário e a criminalização da homofobia.

O gay macho alfa é covarde. Se esconde atrás de músculos, preconceitos e definições como “macho”, “homem de verdade” e “não efeminado” – termo que a grande maioria usa erroneamente como “afeminado” – para se proteger da intolerância da sociedade. Intolerância esta que o gay macho alfa partilha com a mesma. Em vez de se impor contra o ódio dos preconceituosos, se junta a ele.

Homem de verdade, meu caro gay macho alfa, é a travesti, que se veste de mulher e não teme ser apedrejada ou apontada nas ruas.

Homem de verdade, meu caro gay macho alfa, é a transexual que aceita sua verdadeira identidade de gênero e vai atrás dos seus sonhos.

Homem de verdade, meu caro gay macho alfa, é o casal de “efeminados” que vai ao supermercado e não tem vergonha de se beijar/andar de mãos dadas.

Homem de verdade, meu caro gay macho alfa, é o casal que vai a um cartório exigir o registro de união estável, garantido por lei.

Homem de verdade, meu caro gay macho alfa, é o homossexual que é espancado na rua. É o que leva “lampadada” na Avenida Paulista.

Homem de verdade, meu caro gay macho alfa, é o parlamentar, como Jean Wyllys (PSOL-RJ), que luta pelos direitos dos homossexuais

Homem de verdade, meu caro gay macho alfa, é a que você chama de “bichinha”, que vai para a balada e “bate cabelo” e dança até o chão ao som de Britney Spears.

Homem de verdade, meu caro gay macho alfa, é o gay que vai ás ruas protestar por direitos iguais.

Estes sim são dignos de orgulho e merecem todo o respeito da sociedade. Você, meu caro gay macho alfa, é muito mais ‘bichinha”, “afeminado” e “mulherzinha” do que qualquer um dos que citei acima. E sabe por que? Porque sua virilidade machista e toda sua falsa masculinidade só lhe são úteis na cama. Quando a vida lhe pede para dar um passo à frente, você se esconde no armário.

Um viva a todos os homossexuais corajosos que não fazem parte do grupo “gay macho alfa”!

Alexandre Parrode é repórter e colunista do jornal A Redação.

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