Veja matéria do Diário da Manhã:
Eleitor não quer o novo: quer quem faz
Pesquisas qualitativas mostram que recrudesce busca pelo novo. Eleitorado prefere quem faz ou quem promete e cumpre
Diário da Manhã
Welliton Carlos
Com a chegada da temporada eleitoral, sempre surge a discussão do que se passa na cabeça do eleitor. Políticos tentam captar os anseios da opinião pública para produzir seus discursos. Não é novidade para ninguém que a comunicação e o teatro político são peças fundamentais na disputa.
Logo após as manifestações de junho de 2013, surgiu a hipótese de que o eleitorado iria optar nas urnas pelo novo. É comum nos períodos de estagnação e grande redundância política surgir esta ideia. Sem antes de uma avaliação criteriosa, as estratégias de campanha, porém, não devem seguir esta linha, alertam especialistas.
Recentes sondagens de pesquisas qualitativas realizadas no país sugerem que o ‘novo’ não será a estratégia vencedora. Radicalização de Black Blocs, tempo maior para discernimento do eleitorado e exemplos negativos do que já se apresentou como novo tendem a minar os discursos dos candidatos que são, de fato, desconhecidos. Em todo País, raros são os realmente novos que postulam cargos majoritários.
“A ideia do novo não pode se confundir com o desconhecido. Uma coisa não tem nada a ver com o outra. Se o novo for também desconhecido o eleitor tende a rejeitar. Eleitor vota de forma pragmática: em quem o emociona, em que lhe dá algo em toca ou em políticos muito carismáticos, construídos graças a uma grande exposição midiática”, diz Jorge Alemida, que pesquisa estratégia de campanha e marketing eleitoral.
O novo, diz Alemida, deve cativar primeiro os formadores de opinião (como a mídia, religiosos e sindicatos, por exemplo) antes de cair nas graças do grande eleitorado. Alemida explica que o melhor exemplo recente, nas duas últimas décadas, é de Fernando Collor de Melo, que no final dos anos 1990 se apresentava como o novo, mas era desconhecido. “Sua estratégia foi sair em toda a imprensa. E ele tornou-se aquele personagem vitorioso quando foi capa da revista Veja. Mas logo se observou que nada de novo existia em seu conteúdo. Foi uma decepção”, recorda Alemida.
O analista explica que as recentes pesquisas, realizadas após as manifestações, mudaram o cenário: em vez de mudanças, o eleitorado quer alguém que resolva as coisas. “Testa-se junto à opinião pública a teoria do novo. Muitos tentam se encaixar neste perfil. Mas antes dele se consolidar, outra concepção se tornou preponderante nos últimos meses: a do político que faz ou que não compromete a ordem das coisas”, diz.
Em outras palavras, o eleitorado assume neste momento uma postura conservadora e busca manter suas garantias ou o que tem conquistado. Alberto Carlos Almeida, acostumado a acompanhar diversos pleitos eleitorais e orientar campanhas por meio do Instituto Análise, ressalta que o eleitor procura alguém que faça o que ele precisa.
Promessas
Diante de uma situação de certeza, o eleitorado escolhe o político que promete algumas garantias. Depois, na dúvida, ou ao ver que nada prometido o interessa, opta pelos políticos mais tradicionais. “Colabora para o eleitor assumir esta atitude o efeito ‘desapontamento’: ele costuma olhar o político que se apresenta como novo com mais cautela. Daí a opção pelos conhecidos”, diz Jorge Alemida, que enxerga na postulação do novo uma estratégia de marketing como outra qualquer: “Tenta-se criar um discurso. Só isso. Não se julga moralmente este discurso. Mas é inegável que o político que se diz novo e seja filho, irmão de políticos tradicionais acaba por ampliar a desconfiança do eleitorado. O novo é alguém que jamais esteve envolvido com a coisa pública, por exemplo. Na política, o novo seria o apresentador Luciano Huck ou Fernanda Montenegro. Isso é novo. O resto, em sua maioria, é uma tentativa disfarçada de construção discursiva para conquistar o eleitor”.
Neste contexto, Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), seria outro realmente novo. Mas existem sondagens que questionam a posição de Barbosa. Alemida suscita a tese do “lobo na pele de cordeiro”. O eleitorado teme fazer escolhas insensatas, daí esperar mais tempo para conhecer o novo. “Com Collor de Melo, ocorreu um encantamento da mídia. Ela acelerou essa recepção e o povo acabou entrando neste discurso ”, diz Por isso Alberto Carlos Almeida diz que o candidato que vence as eleições geralmente não é o mais novo, mas o que consegue dominar o tema de campanha de forma convincente. Ou seja, tem a capacidade de apresentar uma vida pública pregressa e que dê credibilidade ao que propõe.
Assim, em vez de simplesmente escolher o novo, a maioria do eleitorado busca alguém que tenha um histórico de realizações e saiba realmente fazer. Não é à toa que em Goiás os dois nomes que lideram as pesquisas sejam os mais experientes: Marconi Perillo (PSDB) e Iris Rezende (PMDB). O primeiro, apesar de mais jovem, tem maior experiência no governo do Estado, com três mandatos e muitas realizações. E Iris, com grande penetração na Capital, e dois mandatos como governador, tem procurado renovar seu eleitorado. Todos os demais candidatos, que tentam ou tentaram encarnar o novo, não conseguiram e apresentam desempenho pífio nas pesquisas de opinião realizadas até agora.
Alemida diz que o mesmo acontece nacionalmente: “As pesquisas revelam uma preferência para Dilma Rousseff, por simples motivo: ela turbinou a imagem de que é gestora, de que sabe mais e está ali para resolver as coisas. Qual o interesse em mudar?”.
No caso de políticos que almejam a reeleição, um caso chama atenção: a apresentação de um rol com as promessas cumpridas. Não apresentá-las não significa uma derrota, mas ajuda a perder. E o inverso ajuda a ganhar. Alberto Carlos Almeida diz que é preciso observar uma relação de fé do eleitor com o político. Se ele quebra esta relação, perde-se a fé. Por isso ele lembra como alguns termos da política são tão ‘religiosos’. “Promessa é coisa séria porque gera expectativas. Quando estas expectativas não são cumpridas, quem fez a promessa perde a credibilidade”, diz Alberto.
Um caso clássico acontece exatamente agora em Goiás. O governador Marconi Perillo acelera sua equipe para que sejam entregues importantes obras até a metade do ano. Daí sua estratégia: conhecedor do eleitorado, devido a grande experiência política, ele sabe que precisa atender as expectativas. Uma delas é a inauguração do Hospital de Urgências da Região Noroeste, o Hugo 2. Em fase final de acabamento, o Hugo 2 é um trunfo na mão do gestor – se cumprir a promessa, talvez ele assuma a sua candidatura e passe a realmente disputar as eleições de outubro.
O não cumprimento de promessas, por sua vez, leva o político a uma geladeira junto à opinião pública. Foi o que ocorreu com o prefeito de Goiânia, Paulo Garcia. Além de inaugurar uma obra com inúmeros problemas (o túnel Jayme Câmara), atrasar a entrega de outra na Marginal Botafogo, ele deixou com que o governador de Goiás assumisse o Passe Livre Estudantil – que foi, afinal, uma promessa de campanha de Marconi Perillo em 2010. Moral da história: Paulo Garcia foi prematuramente afastado da disputa eleitoral de 2014 exatamente pela inação.
Saiba mais
Novos na política
Na História
Nero Cláudio César Augusto Germânico – Gastou mais do que podia, fazia apologia dos grandes banquetes e de comidas e ordenou o assassinato de inúmeras pessoas, incluindo a mãe. Governo Roma de 54 até a sua morte, a 9 de junho de 68.
No Brasil
Fernando Collor de Melo – Ex-presidente vendido pelo marketing como novo, mas que trouxe velhas modalidades da política oligárquica para o Brasil. Ajudou a montar o moderno aparato de corrupção do Estado, com a relação entre políticos e empresários. Sofreu Impeachment em 1992. Nunca foi novo, pois militava na Arena – o partido que integrou as antigas oligarquias e militares.
Em Goiás
Mauro Borges – Foi menos uma novidade e mais um jovem na administração pública. Venceu as eleições, em 1960, e governou até o final de 1964. Seu governo é considerado moderno, mas teve problemas políticos: primeiro atacou os militares, depois apoiou o Golpe de 1964. Por fim, foi cassado, devido ao grupo de militares não confiar mais nele.
Em Anápolis
Ernani de Paula – Ex-prefeito de Anápolis, afastado após conturbada investigação na Câmara Municipal de Anápolis. Sedutor, com fama de rico, chegou em Anápolis e logo foi eleito prefeito. Rompeu com seu partido, depois com o vice e, por fim, com a classe política goiana. Inicialmente, a população delirava ao vê-lo descer de helicóptero nos bairros pobres. Logo em seguida, porém, começou a derrocada. Anápolis tornou-se um caos. Restou o afastamento, em 2003, por meio de um processo político e uma intervenção estadual, fundamentada no receio de que a cidade iria se implodir.
Redundância de candidato não é suficiente para vencer eleições
A busca pelo novo na política, conforme as teorias de comunicação política, está fundada em duas premissas: esgotamento de ações de um grupo político e redundância da imagem que exerce o governo. Jorge Alemida afirma que o erro é pensar que a simples redundância (repetição do gestor) é capaz de afastar os políticos tradicionais do poder: “Veja que para retirar o político tradicional do poder e inserir um novo é necessário um clima de instabilidade, de caos ou desgoverno. Ainda assim, a opinião pública pode optar pelo experiente ou o político que faz. Basta lembrar que Fernando Henrique Cardoso foi o escolhido após o período de turbulência e não Lula”. Ele explica, contudo, que no exemplo de Collor de Melo, ocorreu uma mudança institucional, em que a população tirou Collor e aceitou o vice-presidente Itamar Franco – apesar dele não ser o ideal do grupo insatisfeito.
O especialista em marketing político afirma que uma eleição não se decide com uma só variável, mas várias. Daí que um conjunto de fatores devem se articular para que ocorra uma vitória nas eleições. “Existem eleições praticamente impossíveis de se vencer, nem com todo dinheiro e poder econômico e político. Quando se chega no período eleitoral, o cenário se formou.”
Ele cita o caso de Brasília: “Ocorre um desgaste do atual governador, não surgiram novidades políticas e o caminho natural agora parece ser uma vitória do grupo hegemônico do Distrito Federal, com Joaquim Roriz à frente.” Lá, diz Alemida, o eleitor vai optar pelo tradicional que faz.
De Nero a Ernani de Paula, o novo na política costuma ter final infeliz
A entrada de jovens e novidades na política é apontada como desastrosas. Geralmente, as novidades, no Brasil, surgem de setores artísticos, esportivos ou empresariais. Quase sempre amargam o ostracismo ou desistem da política. Exemplos não faltam. O jogador Túlio Maravilha, por exemplo, teve uma passagem desastrosa na política, sendo apontado por muitos cronistas políticos como um dos mais medíocres da Câmara Municipal de Goiânia. Sequer foi eleito deputado estadual e abandonou o mandato no meio.
Na história, as novidades trouxeram em sua maioria instabilidade política. Nero, um dos casos mais graves, governou com tamanho risco, que morreu aos 30 anos. O resumo de seu reinado é assustador: tirania e extravagância. Mandava matar por qualquer coisa. Uma das execuções incluiu a própria mãe e o seu meio-irmão. Perseguiu cristãos e fez com que Roma se desgovernasse. É um dos piores gestores de Roma logo após a morte de Cristo, tendo se caracterizado pela gastança: queria comprar tudo, contratava os melhores artistas para se apresentar em Roma e fazia questão de mostrar que era esbanjador.
Um exemplo mais próximo na política atual e que teve um final desastroso em Goiás é o ex-prefeito Ernani de Paula, a novidade na política goiana da década de 2000. Naquele período, o ex-prefeito passou de promessa a ‘persona non grata’ – a ser evitado por demais políticos. Qual o legado do ex-prefeito? Nenhum. Nunca mais assumiu cargo nem voltou a discutir política de fato.