As duas principais “estrelas” do ato de filiação do empresário Júnior Friboi ao PMDB andam aprontando todas. No começo da semana, Michel Temer apareceu no noticiário envolvido em um escândalo de nomeação de uma funcionária da vice-presidência para gerenciar seus negócios imobiliários particulares.
Agora é a vez do bigodudo Levy Fidelix, o exótico e eterno candidato à presidência da República pelo PRTB. Reportagem publicada pela revista Época desta semana mostra que os integrantes do partido descobriram, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), uma fraude tremenda que permite a Levy, o homem do aerotrem, se perpetuar ad eternum no comando da legenda.
Veja a matéria:
O aerotrem da alegria
O presidente do PRTB, Levy Fidelix, é acusado por ex-aliados e pelos próprios correligionários de usar o partido para enriquecer
Levy Fidelix sempre foi um homem audacioso. Há mais de 40 anos, achou que tinha futebol para suceder o maior ponta-direita de todos os tempos, Mané Garrincha. “Era conhecido por derrubar goleiro com a bola”, diz ele. Levy postulava a camisa 7 do Botafogo no final dos anos 1960. A carreira no Glorioso não prosperou – Levy desistiu ainda nas categorias de base –, e ele resolveu tentar a política, com um nível de ambição igualmente alto. Nas últimas duas décadas, Levy tentou de tudo. Foi candidato a vereador, vice-prefeito, prefeito (três vezes), deputado federal (três vezes), governador (duas vezes) e até presidente da República (duas vezes). Perdeu todas as eleições que disputou. Orgulha-se de duas coisas em sua vida política. Uma é o aerotrem, proposta recorrente de sua plataforma – veículo que, adotado em grande escala, resolveria o problema de transporte das grandes cidades, transformando a paisagem de nossas metrópoles em mangá japonês. Levy se jacta também de ser constantemente reeleito à presidência da sigla que fundou, o Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB).
Essa segunda glória está sob suspeita. Seus próprios correligionários – e ex-correligionários – o acusam de pilotar uma espécie de aerotrem da alegria. Uma ação movida por integrantes do partido, na 12ª Vara Cível de Brasília, questiona a forma como Levy mantém o controle da legenda por quase duas décadas. Os integrantes do PRTB o acusam, entre outras coisas, de ter fraudado as últimas três eleições do diretório do partido para manter-se no comando do PRTB.
Em janeiro do ano passado foi realizada a última Convenção Nacional do PRTB, para eleger o diretório partidário. O mandato valeria entre 2012 e 2016, com recondução automática autorizada até 2020. Foi apresentada uma chapa única, fato habitual no partido, composta de 45 membros titulares. Como sói acontecer com chapas únicas, a de Levy Fidelix venceu. O tempo passou e, meses depois, em consulta ao site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), integrantes do PRTB descobriram um fato curioso. A chapa tinha 45 integrantes. Onze deles não constavam na lista de filiados ao partido no sistema FiliaWeb, do TSE – condição sine qua non para concorrer ao diretório. Uma 12ª segunda integrante era filiada a outra sigla, o Partido Progressista (PP): Lecy Araujo Fidelix. A mãe de Levy.
Espantados com o que haviam acabado de descobrir, eles decidiram cruzar informações relativas às eleições do diretório em 2004 e 2008. Descobriram que as práticas eram antigas – tanto apresentar integrantes sem filiação, quanto incluir parentes nas chapas. Cinco eleitos para o diretório, em 2004, não eram filiados ao PRTB, assim como sete dos que compunham a chapa vencedora em 2008. Em 2004, seis dos 12 integrantes da Comissão Executiva do partido eram parentes de Levy. Sua mulher, três filhos e dois primos integravam a Comissão. Os seis também compunham a Comissão eleita em 2008. Cinco deles constavam na que ajudou a pilotar o aerotrem, ou melhor, o partido, entre 2004 e 2008.
Segundo a ação, “mantendo o controle absoluto sobre o Diretório Nacional e sua Comissão Executiva, Levy Fidelix garante seu poder sobre a agremiação, afastando toda e qualquer posição democrática que possa (e deva) existir. Transforma uma instituição que deveria ser aberta e plural em ‘cosa nostra’, voltada para seus interesses pessoais e familiares, sem nenhuma possibilidade de mudança”.
A ação faz uma denúncia ainda mais grave: Levy e os membros da Comissão Executiva, “composta majoritariamente por parentes seus”, são acusados de manter o controle do partido “para dele extrair recursos financeiros”. Eles se referem ao dinheiro do Fundo Partidário, a ajuda de custo que as siglas recebem, proporcional a sua representação política. O PRTB recebeu, em 2012, mais de R$ 1,7 milhão, origem de mais de 70% dos recursos do partido no ano anterior. Quase R$ 1,4 milhão vieram do Orçamento da União. Por causa disso, a ação reivindica, além da suspensão da eleição do diretório e de novas eleições, o bloqueio das contas bancárias do PRTB. Segundo a ação, o partido se converteu “numa empresa pertencente à família Fidelix”.
O dinheiro público do Fundo Partidário não é o único que passa pelas mãos da Comissão Executiva do Diretório. Nas eleições de 2012, quando Levy disputou a prefeitura de São Paulo pela terceira vez, ele declarou à Justiça Eleitoral ter recebido R$ 339 mil em doações, 99,76% de doadores ocultos. Os únicos R$ 800 doados de forma aberta saíram do próprio bolso de Levy. Segundo sua prestação de contas, cada centavo arrecadado foi gasto na campanha. Mesmo tendo perdido mais uma eleição – ele terminou o primeiro turno com 0,32% dos votos, na oitava colocação –, seu patrimônio cresceu 172% entre 2010 e 2012. Há três anos, quando se candidatou à Presidência, Levy declarara ao TSE um patrimônio de R$ 150 mil. No ano passado, declarou ter R$ 410 mil, mais da metade relativo a um “crédito decorrente de empréstimo”. A ação acusa Levy de ter o partido como meio de vida. Afirma que sua biografia “não demonstra envolvimento em qualquer outra atividade profissional”. Levy costuma se apresentar como “jornalista e redator”.
O advogado do PRTB, Marcelo Duarte, confirma que a mãe, a mulher e os três filhos de Levy fazem parte do diretório,“por acreditar na ideologia proposta pelo partido”. Sobre a mãe de Levy ser filiada ao PP, ele diz que foi um equívoco do Partido Progressista, já que Lecy está no PRTB há mais de 12 anos. Sobre a evolução patrimonial de Levy, Duarte afirma que se deveu à valorização de um imóvel, antes declarado por seu valor nominal, e não de mercado. Ele diz que Levy é empresário, jornalista e ministra palestras “em todos os Estados do país”, e não recebe nada como dirigente do partido, com o qual só pretende “auxiliar o crescimento de nosso país e a melhora na condição de vida de todos os cidadãos brasileiros”. Com relação à acusação de que 11 integrantes do diretório não são filiados ao partido, ele afirma que tudo foi esclarecido na defesa já apresentada. “Foi apenas uma falha no sistema FiliaWeb, já reconhecida num ofício pela própria ministra corregedora da Corte, Nancy Andrighi. Todos os componentes do diretório são filiados ao PRTB.”
ÉPOCA procurou Levy várias vezes na sede do PRTB, em São Paulo. Ele não foi encontrado nenhuma vez. A informação é que Levy passa as terças, quartas e quintas-feiras em Brasília, cuidando dos interesses do partido. A bancada do PRTB conta com apenas um deputado federal, Áureo Ribeiro (RJ), e nenhum senador. Levy está sempre em Brasília. Tomando conta dos interesses do partido – como se fosse sua própria família.