terça-feira , 16 julho 2024
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Jornal Opção: anúncio de Friboi vira piada e recebe duras críticas no Senado

Veja matéria do Jornal Opção sobre a campanha publicitária da Friboi:

 

Propaganda Polêmica

Você já verificou se é Friboi?

Peça publicitária que virou piada no meio social gerou polêmica no Congresso Nacional, onde recebeu duras críticas da senadora Kátia Abreu

Marcos Nunes Carreiro

“É Friboi?”. O leitor com certeza já ouviu essa per­gunta em tom jocoso pelas ruas. Um amigo, uma brincadeira entre os filhos ou mesmo em alguma paródia na internet. O alvo das piadas é a propaganda do frigorífico JBS-Friboi, a maior empresa em processamento de proteína animal do mundo.

Informações de mercado dão conta que a campanha publicitária custou mais R$ 50 milhões. E não é à toa, pois os anúncios são feitos nos grandes jornais e nas principais redes de rádio e TV do Brasil. Uma família está assistindo televisão, veículo de maior penetração no País, e eis que surge a figura do ator global Tony Ramos abordando pessoas nos supermercados e perguntando se a carne é Friboi.

Uma propaganda normal, mas que apresenta alguns problemas. Pelo menos é o que afirma a senadora Kátia Abreu (PSD-TO), que em plenário fez duras críticas ao frigorífico Friboi. O motivo, segundo ela, é a afirmação de que o produto da empresa representa a “única carne boa e que é garantida no Brasil”. A parlamentar, que também é empresária rural, diz que há muitas empresas com o Certificado de Inspeção Federal (CIF), selo que autoriza a comercialização de carnes no País.

Ela acusa a empresa de praticar “marketing enganoso” e sai em defesa das demais empresas do ramo. “Reconheço que as empresas precisam ter direito de fazer seu marketing. Mas temos de ter o cuidado e a cautela de não praticar a propaganda enganosa. E cabe a mim, que conheço esse setor tão bem, dizer que não temos só uma marca boa e, sim, centenas de marcas boas e que possuem o CIF. Portanto, o CIF do [Grupo] JBS não é diferente do certificado das demais marcas”, declara.

A carne brasileira — não só a bovina – passa pela inspeção das autoridades federais e, quando aprovada, recebe um carimbo garantindo sua procedência e qualidade. Esse é o CIF. Uma vez conquistado o selo, a qualidade daquela carne é, pelo menos em tese, igual à de qualquer outra marca que também tenha sido certificada.

Kátia Abreu, que é presidente da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), afirma que quase 80% da carne produzida no Brasil é consumida no País, ficando os outros 20% para exportação. Nesse aspecto, a grande preocupação da senadora é que propaganda coloque o mercado interno em alerta, angustiando os pequenos e médios produtores. E isso poderia ter reflexos no mercado exterior, que recebe a carne brasileira em larga escala.

E embora o País tenha grandes possibilidades de produção, há muitos produtores pecuários. Goiás, por exemplo, é um Estado em que uma pessoa não precisa necessariamente ficar presa à pecuária ou ao cultivo de determinado tipo de produto. E isso é bom para a economia, visto que a agropecuária é o carro-chefe da economia brasileira, sendo responsável por conduzir, por exemplo, a reação do PIB, que terminou o trimestre com alta de 1,5%. Somente o agronegócio apresentou crescimento de 3,9% em relação ao primeiro trimestre.

Dessa forma, não é difícil achar produtores pecuários e frigoríficos espalhados pelo Estado. No último levantamento realizado pela Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), havia aproximadamente 15 frigoríficos com selo CIF no Estado, sendo 10 com autorização para levar seus produtos à União Europeia (UE), 3 para os Estados Unidos e 8 para a Rússia. Com inspeção estadual (CIE), eram 73 empresas, sendo 58 de carne bovina. Já na parte municipal (CIM), a Vigilância Sanitária não soube informar a quantidade de estabelecimentos.

Ecos da reclamação parlamentar

A fala da senadora ecoou pelo País. José Mário Schreiner, seu companheiro de direção na Confederação da Pecuária e Agricultura do Brasil (CNA) e presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), endossa as palavras de Kátia Abreu e relata que não só a Friboi é uma boa empresa.

Para ele, as outras também são boas, porém, sem a mesma estrutura para realizar uma campanha dessa envergadura. “E o pior: com dinheiro público. O grupo JBS possui muitos empréstimos no BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento], que é um dos principais acionistas da empresa”, afirma.

Schreiner é incisivo ao dizer que ao dizer que é a única qualificada, a Friboi pode matar algumas pequenas e médias empresas pelo Brasil. “Não podemos matar as pequenas e médias empresas. Ao contrário, elas devem ser preservadas, pois assim são empregos são mantidos. Mas gostaríamos muito que o BNDES aportasse recursos para essas empresas também.”

O presidente da Sociedade Goiana de Pecuária e Agricultura (SGPA), Ricardo Yano, concorda com Schreiner e analisa que, sendo o Brasil o maior exportador de carne do mundo, o reflexo de apenas uma empresa frigorífica não pode ser o único a despontar. “A Friboi não pode ser vista como a única a possuir qualidade, pois essa situação resultará em consequências graves para o mercado”, diz.

Yano declara que existe monopólio da carne no mercado brasileiro, uma vez que o grupo JBS é o maior frigorífico do mundo. “Esse domínio prejudica o mercado, pois quando se centraliza o mercado em um ou duas empresas fica fácil definir qual será o preço de mercado. E nisso o produtor fica desestimulado, pois os preços são altos, o que pode resultar em uma menor produção. Se isso ocorrer, toda a cadeia será afetada, inclusive os frigoríficos”, afirma.

A diminuição na produção de carne, explica Yano, prejudica o mercado ao passo em que a pecuária não é como o agronegócio. Para aumentar a produção de carne são necessários pelo menos três anos. Dessa forma, com uma produção menor não só o Estado sairá prejudicado como o consumidor final, que vai pagar mais caro.

Estratégia publicitária equivocada?

Há divergências quanto à propaganda do frigorífico Friboi. O publicitário Marcus Vinícius Queiroz aponta que a estratégia publicitária da empresa foi equivocada, pois não seria preciso empreender uma campanha tão agressiva para tentar fortalecer uma empresa que já é reconhecida. Além disso, aponta ele, não dá respaldo para o grupo dizer que é o melhor ao passo em que aponta as outras empresas como ruins. “E ainda usa, de forma indireta, o selo de certificação nacional para atestar a qualidade única do produto”, fala.

Segundo ele, é um erro não apontar a propaganda para a grande parcela da população, uma vez que o consumo dos municípios de interior não se dá nos grandes supermercados e, sim, nos açougues, que recebem as carnes direto do abate. Assim, é certo dizer que pelo menos 70% dos municípios compram direto dos açougues. “Logo, a propaganda não reflete a realidade nacional”, declara.

Já o publicitário e jornalista Rosenwal Ferreira aponta que, sob o ponto de vista publicitário, a propaganda não é equivocada. “Muito pelo contrário, só há acertos. As peças publicadas atingem um grupo extremamente seleto, pois me parece que a intenção com o nome Friboi vai além da venda do produto. Se a propaganda vai desestabilizar os outros produtores, não é essa a regra do capitalismo? Agora, se há irregularidades é no campo jurídico, pois não sei até que ponto isso esbarra na questão de cartelização. Mas essa já é outra discussão”, diz ele.

Campanha com objetivos eleitorais?

Do ponto de vista analítico, a propaganda do frigorífico Friboi, realmente, tem um ar de algo estruturado. A campanha é muito cara e tem grande penetração nas classes A e B, o que a torna a peça elitizada, uma vez que não atinge a grande massa consumidora. Ou seja, as pessoas das classes C e D, que tem um consumo de carne muito maior que as classes de elite não são atingidas pela propaganda.

No campo da especulação tem-se o seguinte: Júnior do Friboi, ex-acionista majoritário do Grupo JBS, é um possível candidato ao governo de Goiás. Porém, não tem adesão da população, pois não é conhecido. À época de sua filiação ao PMDB, ele disse que queria mudar sua identificação política de Júnior do Friboi para Júnior de Goiás. Alguns podem dizer que se tratava de uma precaução para que ele pudesse, posteriormente, fazer uma campanha fortalecendo a empresa Friboi e, por tabela, dar força ao seu nome, pois ninguém deixou de chamá-lo de Júnior do Friboi. Com esse “antivírus”, ele se livra de processos por propaganda extemporânea.

O fato é que a propaganda é polêmica. O Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), contudo, não quis se posicionar a respeito do tema. Entre­tan­to, a reportagem apurou que alguns frigoríficos procuraram o conselho para reclamar da propaganda. Porém, como nenhuma empresa do ramo é associada à entidade, o Conar não recebeu o processo.