O presidente da Câmara de Goiânia, vereador Clécio Alves (PMDB), fez declarações consideradas antiéticas pela Associação Ecológica Vale do Meia Ponte a respeito da obra do Grupo Hypermarcas por ter incitado a desobediência ao Plano Diretor da Cidade. Por isso, a entidade denunciou o vereador ao Conselho de Ética da Câmara e quer sua punição.
Leia a matéria do Jornal Opção, assinada por Elder Dias, que explica a polêmica:
Caso Hypermarcas
Clécio Alves também vira alvo de representação no Conselho de Ética
Defesa da obra irregular de megaempresa leva associação a entrar com denúncia contra o presidente da Câmara, que teria incitado desobediência às leis municipais
Elder Dias
A Associação Ecológica Vale do Meia Ponte (Verdivale) entrou com representação contra o presidente da Câmara de Goiânia, vereador Clécio Alves (PMDB), por conta de declarações feitas no dia 14 de março, durante sessão do Legislativo goianiense. Na ocasião um bate-boca entre o peemedebista e Djalma Araújo (PT) causou a suspensão dos trabalhos do dia. O fato gerou denúncia ao Conselho de Ética do primeiro contra o segundo, acusado de ferir o decoro parlamentar.
Os vereadores debatiam sobre a paralisação das obras do centro de distribuição do grupo Hypermarcas em área na região norte da capital. O local é tido pela Verdivale e pelo Ministério Público como de preservação ambiental — fica próximo ao Rio Meia Ponte e tem lençol freático bastante superficial. Clécio defendia a liberação das obras, que se encontram em situação irregular. Na ocasião ele requereu vistas do pedido de audiência pública feito por Djalma Araújo, que ficou indignado com a atitude. A reunião acabou suspensa.
Agora, a mesma polêmica gera nova representação, contra Clécio Alves. A Verdivale se baseia nas declarações do vereador durante a discussão acalorada com Djalma. Na defesa da obra, segundo a entidade, que representa os moradores da região norte da capital, o peemedebista teria incitado a desobediência ao Plano Diretor da cidade. Ele chegou a declarar que defenderá um empreendimento com o da Hypermarcas “doa a quem doer”. Em sua intervenção, também disse que outras obras na capital teriam sido tratadas sem maior rigor — e citou, por exemplo, a construção do shopping Passeio das Águas na Avenida Perimetral, às margens do Córrego Caveirinha e relativamente não distante da construção da Hypermarcas.
“O presidente de um Poder não pode incitar que as pessoas cometam irregularidades. Ele fez exatamente o contrário de sua função, que é elaborar leis e zelar pelo cumprimento delas”, declarou o diretor ambiental da Verdivale, Joaquim Tavares. “Ele disse que outras obras ilegais estão sendo ou foram executadas. Quer dizer que, se outros estão errados, uma empresa pode continuar errada também? Ora, se o poder público está falhando com outras empresas por falta de aviso ou denúncia, no caso da Hypermarcas está se omitindo, porque o caso está na imprensa desde o ano passado”, questionou. De fato, em julho de 2012, na edição 1930, o Jornal Opção já alertava para a obra da megaempresa, que então já se encontrava em andamento havia alguns meses.
Joaquim Tavares espera que a Comissão de Ética, comandada pela vereadora Célia Valadão (PMDB), investigue e puna o vereador. “Ele (Clécio) é um representante do povo. Tem de zelar pela lei. O que ele fez é como dizer que, se alguém dirige alcoolizado, ninguém pode proibir que outro faça a mesma coisa. Isso promove o descrédito da população nas instituições e torna o Brasil uma terra de ninguém”, desabafou.
Decisão judicial
Na semana passada, o Ministério Público ganhou uma batalha na Justiça contra o grupo Hypermarcas: o juiz Jeronymo Pedro Villas Boas acolheu de forma parcial a liminar feito pela promotora Alice de Almeida Freire e proibiu que o poder público municipal autorize novos empreendimentos industriais e comerciais na região norte até o julgamento do mérito da ação civil pública proposta pela 7ª Promotoria. Villas Boas deu dez dias para que a empresa apresente cópia integral do procedimento de expedição do uso do solo em seu favor, bem como licenciamento ambiental para as obras já em edificação.
Veja os trechos do discurso de Clécio Alves em que ele defende a obra irregular:
Jornal Opção publica trechos da ata que registra discurso do vereador Clécio Alves, presidente da Câmara de Goiânia, defendendo a obra considerada irregular:
Trechos de ata revelam polêmica
A reportagem do Jornal Opção acessou o processo (disponível on-line pelo site da Câmara de Goiânia) de Clécio Alves contra Djalma Araújo, do qual consta a ata da conturbada sessão do dia 14 de março. Nela, o peemedebista faz a defesa da obra da Hypermarcas apontando que já houve erros no passado e, sob essa base, questiona por que agora alguém desejaria impedir essa construção. Abaixo, trechos do discurso do vereador Clécio Alves em que defende a obra irregular, transcritos como estão na ata:
“(…) Esta Casa, se cometer a irresponsabilidade de fazer com que esta empresa seja impedida de continuar funcionando aqui no Município, oferecendo emprego, impostos, será responsabilizada, absolutamente responsabilizada, por essa ação contra os interesses de Goiânia. Aí pergunto as Vossas Excelências: mas e o Shopping das Águas? Está certo, tudo bem! Shopping das Águas, não sei de quem é, de onde veio, como veio, está construindo em cima de um córrego, verdade; CICAL VECEL há pouco tempo, construiu em uma área pública invadida em cima de um córrego, está certo; Motel Sol, mais de cento e trinta apartamentos, construiu desmatando uma quadra inteira com angicos que tinham mais de quinhentos anos naquele local; (…) Pergunto a Vossas Excelências: Vossas Excelências sabem o motivo pelo qual a Prefeitura, através dessa ação, está querendo impedir que seja construída a ampliação da empresa que está aqui há mais de trinta anos e é uma empresa séria? (…)”
E continuou: “Eu, Clécio Alves, estou aqui, de público, assumindo, a partir deste momento, a defesa desse assunto, a defesa da cidade e Goiânia, me dirigindo aos Senhores, pois os interesses de Goiânia falam muito mais alto. Tem aqui um dos Vereadores desta Casa, e espero contar com o apoio dos outros, para que possamos, se for o caso, adequar àquilo que porventura se deve fazer, porque a lei, ela não está acima da verdade (…) E eu não sei qual será o caminho, mas vou defender os interesses de Goiânia, doa a quem doer. Doa a quem doer!”
Encerrado o momento do presidente da Câmara — que ressaltou ter falado “como vereador de Goiânia” —, a vereadora Cida Garcêz (PV) interveio para dizer: “Dei muita atenção à fala do Clécio Alves e vi o quanto esta Casa vem errando desde outros mandatos. Vocês prestaram atenção, o quanto de área pública, do meio ambiente, de nascentes, já foram ocupadas? E um erro não justifica o outro, Clécio. Não justifica mesmo.”
A reportagem tentou contato com Clécio Alves na noite de quinta-feira, 28, logo após o representante da Verdivale ter apresentado a denúncia ao Jornal Opção, mas o vereador não atendeu às ligações.
A reportagem original pode ser vista aqui