Editorial publicado hoje no jornal O Estado de S.Paulo afirma que o BNDES fracassou na tentativa de promover a economia brasileira a partir de linhas de crédito – que beiravam a filantropia – disponíveis para algumas poucas empresas eleitas, entre elas o JBS Friboi.
A boa notícia é que o BNDES finalmente vai abandonar essa política. “Sem reconhecer o fracasso, o presidente do banco, Luciano Coutinho prefere apresentar como concluída ‘a promoção de competitivade de grandes empresas de expressão internacional”.
Esta política bastante questionável do governo federal começou no governo Lula, há seis meses, quando o Palácio do Planalto começou a incentivar fusões e aquisições de empresas menores por parte de outras maiores, as favoritas e escolhidas pelo governo. “Apesar de todos esses erros, a política poderia ser defensável como conceito. Mas nada se salva, nessa história de equívocos e desperdícios”.
Veja o editorial:
Hora de revisão no BNDES
Depois de aplicar R$ 18 bilhões em grupos selecionados para serem campeões do mercado, com muito desperdício e nenhuma contribuição ao progresso do País, o BNDES vai finalmente abandonar essa política. Sem reconhecer o fracasso, o presidente do banco, economista Luciano Coutinho, prefere apresentar como concluída “a promoção da competitividade de grandes empresas de expressão internacional”. Essa orientação, disse ele ao Estado, “tinha méritos” e chegou “até onde podia”. A explicação da mudança de rumo é tão discutível quanto foi a política iniciada há seis anos, quando a instituição começou a incentivar fusões, aquisições de empresas e programas de expansão internacional de companhias favoritas do governo.
Segundo o presidente do BNDES, poucos setores têm potencial para projetar empresas como líderes internacionais. Sua lista inclui siderúrgicas, frigoríficos, petroquímicas e indústrias de celulose, cimento e suco de laranja. “Não enxergo outros com o mesmo potencial”, disse ele na entrevista. Seu julgamento equivale, portanto, a uma condenação de um enorme número de indústrias como incapazes de batalhar por fatias significativas do mercado global.
Se essa opinião for correta, a Embraer está destinada ao fracasso, apesar de seu atual sucesso em segmentos importantes do mercado. Fabricantes de máquinas, veículos e outros equipamentos estão igualmente iludidos, se ainda esperam algum sucesso internacional, assim como os produtores de tecidos, roupas e sapatos. Melhor seria fechar suas instalações e cuidar de algo mais promissor. Além do mais, por que o próprio BNDESPar, o ramo de investimentos do banco, ainda se interessa, como disse Coutinho, por setores como o farmacêutico, de informação e de bens de capital?
A política do BNDES foi errada tanto na formulação conceitual quanto na seleção dos beneficiários efetivos de sua política. Alguns grupos eleitos para ser vencedores atolaram-se em problemas financeiros. Marfrig e LBR (Lácteos Brasil) são apenas dois exemplos. Sem pôr em dúvida as motivações de cada operação, é impossível, no entanto, deixar de apontar graves falhas na avaliação de cada negócio apoiado pelo programa. Em fevereiro deste ano o BNDESPar confirmou a baixa contábil de R$ 657 milhões relativos à sua participação na LBR. O banco contribuiu com R$ 700 milhões para a criação da gigante do setor de leite, em 2011, passando a deter 30,28% de seu capital.
Alguns erros de julgamento custaram centenas de milhões ao sistema BNDES. A imprensa ajudou a evitar um dos enganos mais grotescos, quando o BNDES chegou a um passo de se envolver na tentativa de compra do Carrefour pelo Pão de Açúcar. Seria uma trapalhada enorme, porque os sócios franceses do Pão de Açúcar certamente contestariam o negócio com a rede concorrente. Evitou-se na última hora um vexame de proporções incomuns.
Apesar de todos esses erros, a política poderia ser defensável como conceito. Mas nada se salva, nessa história de equívocos e desperdícios. A política seguida por seis anos foi indigente do ponto de vista estratégico. Sua contribuição para elevar a eficiência e o poder de competição da economia brasileira foi nula – ou negativa, quando se considera o mau uso de recursos. Nenhum obstáculo estrutural ao crescimento e à modernização das empresas foi removido. Os dirigentes do banco desprezaram o julgamento da maior parte dos empresários sobre as possibilidades de cada empresa e de cada setor. Assumiram uma visão estática, sem levar em conta a criatividade e a capacidade de transformação das companhias privadas. Não se pode, no entanto, falar de incoerência.
A má política do BNDES foi um perfeito complemento da indigência estratégica e gerencial do governo da União, incapaz de promover investimentos indispensáveis na infraestrutura, de melhorar os gastos públicos, de remover entraves ao desenvolvimento – tributários e outros – e de buscar os acordos comerciais necessários à abertura de mercados para os produtores nacionais.
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