Com o mesmo efetivo de 30 anos atrás, a Polícia Civil de Goiás (PC-GO) aguarda um parecer do Estado a respeito da nomeação dos aprovados no último concurso cujo prazo, já prorrogado, expira no próximo dia 22 de maio.
No total, o quadro de pessoal da PC conta com 145 cargos de delegado substituto, mas apenas 3 encontram-se preenchidos neste momento. Dos 538 cargos de delegado, 253 estão vagos (47,02%) e a situação não é muito diferente da retratada no ano passado, quando matéria do O POPULAR revelou que 70% das cidades de Goiás não possuíam delegados titulares e o déficit ocorria justamente em cidades com alto índice de criminalidades.
Depois de concursos anulados por problemas no gabarito e fraudes no processo em 2016 e 2017, a Polícia Civil realizou um certame e 110 delegados foram aprovados, em 2018. No total, eram 100 vagas para o cargo de delegado de polícia substituto e, em agosto do ano passado, apenas 80 participaram da formatura. Isso porque, muitos deles já haviam sido aprovados em um concurso da Polícia Federal e os demais, oriundos de outros Estados, não conseguiram se manter em Goiás, sem a nomeação.
O concurso foi homologado em 21 de maio de 2019 e o prazo para nomeação era de seis meses, podendo o governo estadual prorrogar por mais seis meses. A prorrogação aconteceu e agora, o prazo termina em 22 de maio de 2020.
No último dia 6 de fevereiro, o delegado-geral da Polícia Civil, Odair José, chegou a encaminhar um ofício ao secretário de Estado de Segurança Pública, Rodney Miranda, solicitando a nomeação de aprovados no concurso para provimento de cargos vagos de delegado de polícia substituto.
No documento, o delegado-geral explica que o que se pretende é “apenas, a reposição do efetivo, com o preenchimento de vagas ociosas decorrentes de vacância, e não ao incremento do número de efetivo a partir do preenchimento de novos cargos criados”.
Presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia Civil de Goiás (Sindepol), Adriano Costa afirma que financeiramente, a nomeação é possível para o estado e “absolutamente viável”.
Costa justifica dizendo que tanto a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) quanto o decreto de contingenciamento de gastos editado pelo governo estadual excepcionam a Segurança Pública e a Saúde dos cortes necessários em momentos de crise, justamente por entender que investimentos nessas duas áreas são imprescindíveis para a continuidade da prestação do serviço público com qualidade.
“A nomeação é absolutamente viável e extremamente necessária. As categorias da Segurança Pública e da Saúde estão expostas a maiores riscos de contaminação e, portanto, deveriam receber incentivos dos governos, e não cortes. É claro que, nesse caso da nomeação, não é uma vantagem pessoal que está sendo buscada, até porque a nomeação de tais concursados minimiza mesmo são os impactos do adoecimento dessa categoria nesse momento. Por isso, contratá-los agora é, inclusive, garantir uma reserva de pessoas para, em se agravando o quadro de contaminação, existir possibilidade de recomposição mínima da capacidade instalada da Polícia Civil”, pondera o presidente do Sindepol.
Um dos aprovados, que preferiu não se identificar, diz que a fundamentação e justificativa para não nomeação se dá pela falta de dinheiro e pela LRF. Para ele, as duas situações são inverídicas e não se sustentam. “Existem várias contratações diárias de comissionados e temporários e dentro da Segurança Pública, é permitida a contratação em caso de vacância. Temos vacância, temos aposentadoria. A nossa contratação não está vedada como o Estado fala o tempo todo. Entendemos perfeitamente o momento que estamos passando, crise de saúde, crise econômica, momento complicado. Levamos algumas propostas de nomeação, mas até agora a administração pública se mantém inerte. Entendemos a sociedade, entendemos o Estado, mas queremos uma resposta e não temos.”
Processo “sob análise”
Em nota, o Governo de Goiás, por meio da Secretaria de Estado da Administração (Sead), informou “que o processo está sob análise dos órgãos estaduais competentes para averiguação do mérito financeiro e judicial. Após o parecer, o Estado irá se manifestar a respeito da situação dos candidatos”.
Também em nota, a Polícia Civil afirmou que está em diálogo permanente com o governo do Estado com vistas à nomeação dos aprovados no concurso.
Posse para depois
Por meio de ofício, o Sindicato dos Delegados de Polícia Civil de Goiás (Sindepol) afirma que pediu à Secretaria de Segurança Pública do Estado de Goiás (SSP-GO) a convocação e, diante de impossibilidade, sugeriu que ao menos fosse realizada a nomeação, com a posse postergada para um momento posterior. A medida seria similar à tomada pelo governo do Distrito Federal e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4).
“É preciso dizer que essa foi uma tentativa de reabrir as negociações, até porque essa sugestão não conta com a chancela expressa dos aprovados no certame. Enfim, até agora não tivemos qualquer resposta formal; por isso, nada mudou, então. Há grande risco de esvaziamento do concurso, e que as vagas oferecidas sequer sejam preenchidas. Isso representa, além da perda de grandes profissionais, desperdício do dinheiro público utilizado para a realização do concurso. Em resumo, quem perde com a não nomeação dos novos delegados é o povo goiano”, finaliza Adriano Costa, presidente do Sindepol.
No total, oito decisões judiciais já foram proferidas mandando nomear candidatos e outros 16 processos devem ser analisados pelo mesmo juiz da 2ª Vara da Fazenda Publica Estadual. O último colocado no concurso chegou a entrar ação para suspender concurso, mas foi negada pelo juiz em 23 de abril. Na decisão, o magistrado ressaltou que com a situação de emergência na Saúde Pública, o Executivo editou decretos de enfrentamento à pandemia do coronavírus. Ainda assim, disse que não há “prática de ato ou criação de fato, por parte do Poder Público, capaz de atingir o patrimônio público, que se pretende tutelar com a presente ação ou mesmo o direito subjetivo dos aprovados em concurso”.
Coronavírus
Com a sobrecarga, principalmente dos delegados no interior do Estado, que acabam respondendo por várias cidades, o pedido dos policiais civis até 2019, era de que as nomeações pudessem garantir estrutura adequada para combater organizações criminosas que migravam da capital. Agora, com a pandemia do novo coronavírus (Sars-CoV-2), o Sindicato dos Delegados de Polícia Civil de Goiás (Sindepol) fala em adoecimento físico e mental, bem como novas demandas que incluem inflação de preços de produtos agora essenciais; aumento de crimes de estelionato, golpes virtuais e falsificação de produtos como máscaras e álcool em gel.
Em um levantamento realizado no primeiro semestre de 2019, 22 delegados acumulavam até sete municípios como área de atuação, contrariando a Lei Estadual 16.901/2010, que proíbe o acúmulo de mais de duas comarcas além da titular. As consequências incluem atraso nas investigações, sobrecarga de trabalho para policiais, ausência de flagrantes, aumento da criminalidade e piora na qualidade dos serviços prestados à população, além da sensação de impunidade. Desde 2014, nenhum delegado é nomeado em Goiás.
Presidente do Sindepol, Adriano Costa afirma que “o cenário não melhorou em absolutamente nada. Na verdade, o quadro até se agravou, principalmente pelas aposentadorias impulsionadas pela recente reforma da previdência”.