segunda-feira , 23 dezembro 2024
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EXCLUSIVO Empresários de Goiânia e Fortaleza são acusados de estelionato em venda de jato de 2 milhões de dólares por 1 dólar

Com autorização do Judiciário e do Ministério Público, corre no 7º Distrito Policial de Goiânia inquérito policial, onde é investigado estelionato e falsidade ideológica na venda de um Jato Citation por apenas 1 dólar. É isso mesmo, leitor: um jato que vale 2 milhões de dólares vendido por 1 dólar.

Entenda o caso

Em 2005 a Distribuidora Farmacêutica Panarello Ltda, de Goiás, e o grupo cearense Agripec/Nufarm, de propriedade de Jorge Alberto Vieira Studart Gomes, venderam para empresa Linknet um Jato Citation ano 1994 (matrícula PP-ISJ) por U$ 2 milhões. Após receberem 99% da aeronave, voltaram a vender a mesma aeronave por apenas U$ 1,00 (um dólar) para a empresa Black Forest, suspeita de pertencer ao mesmo grupo cearense, sediada nas Ilhas Virgens Britânicas, um manjado paraíso fiscal no Caribe.

Em 10 de agosto de 2010, a Linknet e seus sócios entregaram de boa-fé o Jato para os sócios da Panarello e da Agripec/Nufarm a fim de que a mesma fosse nacionalizada e depois devolvida aos verdadeiros donos. Contudo, os proprietários jamais receberam de volta a referida aeronave, haja vista que somente em 2019, em pleno julgamento do caso pelo Tribunal de Justiça de Goiás, descobriu por documentos vindos do Paraguai que o mencionado jato havia sido vendido por U$ 1,00.

Inquérito por estelionato

O inquérito policial foi aberto no final de 2019, após a vítima ter acesso ao  documento novo que provava que o jato havia sido vendido por U$ 1,00, o que comprova que o Leasing não era Operacional, mas sim Mercantil. E mais: que dias antes de a aeronave ser levada do Brasil, ela já não mais pertencia à Cessna, mas sim a uma empresa com sede num paraíso fiscal caribenho.

Também tramita na Justiça de Goiás o processo nº 0234639.61, através do qual a vítima reivindica o recebimento de indenização. Nessa ação foram juntados os documentos novos, em especial o recibo de venda da aeronave a uma empresa estrangeira com sede em paraíso fiscal, pelo valor de US$ 1,00, venda essa realizada sem o conhecimento da vítima, cinco dias antes da aeronave deixar o Brasil, comprovando, assim, que o Leasing era Mercantil e que a aeronave jamais foi devolvida à Cessna.

Consta do processo que, antes da descoberta e juntada dos documentos novos, as empresas envolvidas no suposto crime sob investigação, teriam, durante quase 10 (dez) anos, omitido que a aeronave, antes de deixar o Brasil, já não mais pertencia à Cessna, e que teria sido transferida por US$ 1,00 a uma empresa com sede num paraíso fiscal.

Os advogados da vítima, após descobrirem os documentos novos, pediram o áudio das sessões de julgamento do recurso, e os transcreveram parcialmente. Conforme a transcrição feita pelos advogados da vítima, os advogados da Distribuidora Farmacêutica Panarello Ltda e o grupo cearense Agripec/Nufarm, sustentaram oralmente diante dos Desembargadores, que, por se tratar de Leasing Operacional, todo o valor pago pela vítima teria natureza de aluguel, e que, após o encerramento do Leasing, a aeronave teria sido devolvida à Cessna.

Consta também das transcrições que a defesa da Distribuidora Farmacêutica Panarello teria afirmado aos Desembargadores que,  caso a vítima pretendesse adquirir a aeronave junto a Cessna, teria de pagar o preço de mercado da mesma, que, em 2010, seria algo em torno de mais de 2 milhões de dólares:

31”: “…Nesse contrato, (…), ele se difere do contrato de arrendamento Mercantil, e do contrato de arrendamento financeiro. (…)32”: Então se o valor da aeronave é 20 milhões, só pode ir até 18 milhões o valor do arrendamento.(…) 35” (…)Não é um leasing mercantil isso aqui, não é um leasing financeiro, é um leasing operacional, que só se firma em empresas de transporte aéreo ou transporte coletivo de passageiros ou transporte de carga ou taxi aéreo, que é o caso.(..) 38”: (..). O que há nessas situações? paga-se, volta com a aeronave pra lá, e a Cessna, dá preferência ao arrendatário de ficar com a aeronave que por um preço que fora o valor daquela aeronave com 10 anos de uso no mercado, é assim que acontece.”(g.n.)

34”:(…) Pegou a aeronave novinha, daqui 10 anos, pagou todas as prestações o que tem que fazer a arrendatária? 35”: (…) Devolução da aeronave – (..), no termo desse arrendamento, a arrendatária entregará a posse da aeronave à proprietária. Quem? A Cessna, ela que é a proprietária em Wichita – Kansas, ou em outro lugar que ela indicar, nas mesmas condições quando entregue, voando, obviamente com o desgaste do tempo.(…)

36” (…). É como no aluguel do apartamento por exemplo; como uma locação de automóvel. Tem um prazo, terminou, devolve. Pagou os aluguéis, devolve.(..)

38”: (…) O que há nessas situações? paga-se, volta com a aeronave pra lá, e a Cessna,.(…)

39” (..)Ao final de 120 meses, a aeronave tem que sair do país, voltar a sua origem, e aí sim, ser adquirida pelo cessionário, ou pelo arrendatário, ou por seu sucessor, (..).” ”(g.n)

Diante das alegações dos acusados, o então Desembargador Relator do processo, acabou negando provimento ao recurso da vítima, sob o fundamento de que, tratando-se o Leasing de Operacional, os valores pagos tinham natureza de aluguel, e que, ao final do Leasing, a aeronave foi levada do Brasil para ser devolvida à Cessna:

Voto: “Cuida-se, pois, de contrato pelo qual a arrendadora concede à outra parte, a arrendatária, por um determinado prazo, o direito de utilizar um bem/coisa, cobrando aluguel por esse uso temporário, e admitindo que a certo tempo do contrato a parte que vem utilizando o bem/coisa declare a sua opção de compra, pagando o preço residual, que será o valor total do bem/coisa menos o valor pago pelo aluguel.(…) Isso porque além da constatação de que os valores dispendidos foram repassados à arrendadora e não à ré, por outro lado destinaram-se ao pagamento dos aluguéis (…)a.”(g.n.)

04:10: “O contrato de arrendamento é um contrato muito criterioso, em que o descumprimento de uma das cláusulas incide em pesadíssimas multas perante essa empresa norte americana. Para Vossas Excelências terem uma ideia, se a aeronave foi entregue e não tiver com todos os itens composto para sua devolução, pagará a proprietária Cessna o montante necessário para colocar a aeronave nessa condição, mais transporte, custo e abrigo adequado, mais aluguel diário de $1.698,52 por dia até que a proprietária seja capaz com exercício da devida diligência de colocar a aeronave nessas condições.”

Ao comprovar agora que, antes deixar o Brasil, a aeronave já havia sido transferida pela Cessna pelo valor de US$ 1,00, demonstra forte inconsistência e que em tese os representantes da empresa goiana Distribuidora Farmacêutica Panarello Ltda e os representantes do grupo cearense Agripec/Nufarm teriam praticado diversos crimes, entre eles Estelionato e Falsidade Ideológica.

Julgamento nulo

O que os Desembargadores estão julgando na verdade é se o julgamento é nulo ou não, haja vista que não se respeitaram as regras processuais, considerando que no momento em que documento foi descoberto no Paraguai, o julgamento estava em andamento e o Desembargador vogal que estava com vistas do processo deveria ter retornado ao Desembargador Relator, o que não ocorreu, ferindo assim o direito de defesa das vítimas, uma vez que tal documento prova inclusive um possível estelionato que está sendo apurado pela Polícia Civil de Goiás.

A defesa da Distribuidora Farmacêutica Panarello Ltda sustentou perante o Juiz em Substituição Fábio da Silva Crisóstomo, que o documento é irrelevante, haja vista que na inicial a defesa das vítimas não pediram o Jato de volta. Isso, contudo, deixa claro que o documento descoberto no Paraguai prova em tese o Estelionato e a Falsidade Ideológica, bem como o fato de o julgamento ser nulo, pois deveria ter sido analisado pelo Desembargador Relator, eis que prova tratar-se de Leasing Mercantil e não de Leasing Operacional, o que não ocorreu.

Embora os acusados sócios da Panarello contestem as investigações, o pedido de habeas corpus foi negado, com parecer do Ministério Público pela continuidade das investigações diante as graves denúncias feitas e pelas provas apresentadas, tendo em vista que ninguém venderia um Jato Citation por U$ 1,00.