Ministério Público Federal (MPF) em Goiás, pelo Núcleo de Combate à Corrupção, ofereceu denúncia, no último dia 16 de agosto, contra sete envolvidos em superfaturamento nas obras de construção de trecho da Ferrovia Norte-Sul (FNS) que corta o estado de Goiás. Os crimes praticados foram de peculato (art. 312 do Código Penal), corrupção passiva (art. 317 de Código Penal) e fraude à licitação (art. 96, inciso I, da lei nº 8.666/93). Os denunciados foram Valdemar Costa Neto, ex-deputado federal e ex-presidente do Partido da República (PR); José Francisco das Neves, ex-presidente da Valec; Luiz Carlos Oliveira Machado e Gustavo Henrique Malaquias, ex-superintendentes de construção da Valec; Djalma Florêncio Diniz Filho, diretor-presidente da Pavotec; Itamar Antônio de Oliveira, então engenheiro fiscal da Valec, e Ricardo Ribeiro de Paiva, então engenheiro da empresa supervisora das obras. A denúncia foi baseada em inquéritos policiais, medidas cautelares, acordos de leniência e colaborações premiadas de executivos dasempreiteiras Camargo Correia, Andrade Gutierrez, Carioca Engenharia e UTC/Constran.
De acordo com a denúncia, executivos das principais empreiteiras do país formaram cartel para, mediante acordo de divisão de lotes, combinação de preços e oferecimento de propostas não competitivas (de cobertura, apenas para simular competição), eliminarem a concorrência e dominarem o mercado de construção ferroviária. Assim agindo, no período de 2000 a 2011, frustraram o caráter competitivo das licitações realizadas pela Valec – Engenharia, Construções e Ferrovias S.A. destinadas à construção da FNS, combinando, manipulando e elevando arbitrariamente os preços (sobrepreço), em detrimento da Administração Pública.
Para o procurador da República Helio Telho Corrêa Filho, a atuação do cartel levou à celebração, com sobrepreço, do Contrato nº 065/2010, que é objeto da denúncia. O contrato refere-se às obras do Lote 2S da Concorrência nº 004/2010, deflagrada para a construção do trecho de 136 quilômetros da FNS, entre Ouro Verde/GO e São Simão/GO, subtrecho Rodovia GO-156 (Palmeiras de Goiás) e o início da Ponte do Rio Verdão em Turvelândia/GO. O sobrepreço foi de, no mínimo, R$29.859.750,18, equivalente a 8,7% em relação aos preços de mercado em setembro de 2009, o que, em valores atualizados, alcançam R$76.
No esquema criminoso, Valdemar Costa Neto dava sustentação política a José Francisco das Neves, o “Juquinha”, que, além de homologar os resultados das licitações, aprovar e assinar os contratos superfaturados e provenientes de fraudes à licitação, tinha o papel de garante do cartel. Além disso, para que Juquinha admitisse novas empreiteiras no Cartel, Valdemar Neto cobrou delas vantagem ilícita, espécie de pedágio ou de luvas.
Para se ter uma ideia, apenas as empresas Pavotec, Tejofran e Trial Infraestrutura, que nunca tinham feito qualquer doação eleitoral anterior ao PR ou a seus candidatos, após a solicitação de propina por Valdemar Neto, em 2010 e 2014, ofereceram e efetivamente efetuaram pagamentos em forma de doação eleitoral oficial registrada na Justiça Eleitoral, que somam ao todo quase R$ 1,2 milhão.
Além do pedágio, os dois solicitaram propina às empreiteiras equivalente a 5% do valor do contrato, que deveria ser paga em parcelas, a medida em que as respectivas medições dos serviços a serem executados fossem sendo liquidadas pela Valec. Parte da propina foi solicitada e paga em espécie e parte dissimulada como doação oficial (regularmente declarada à Justiça Eleitoral) para as campanhas eleitorais do Partido da República nos anos de 2010, 2012 e 2014.
Djalma Florêncio Júnior, sócio e diretor da Pavotec, empresa líder do consórcio vencedor do contrato, atuou para viabilizar o seu ingresso e a sua participação no cartel, negociando a propina, realizando contatos com representantes das empresas e dos consórcios concorrentes, combinando a formação dos consórcios, a distribuição dos lotes, os preços a serem praticados, as propostas de cobertura e atuando para que os acordos espúrios fossem cumpridos.
Já os denunciados Gustavo Malaquias e Luís Carlos Machado, ex-superintendentes de construção da Valec, foram responsáveis por elaborar o orçamento de referência, que continha sobrepreço de mais de R$ 35 milhões, correspondente a 10,29% sobre o preço de mercado.
Por fim, os denunciados Itamar Oliveira e Ricardo Paiva concorreram diretamente para o superfaturamento decorrente do pagamento de serviços de fornecimento de aeronave não comprovados. Os dois elaboraram medições atestando que tais serviços haviam sido prestados, o que viabilizou o respectivo pagamento lesivo aos cofres da Valec. O prejuízo causado foi de quase R$196 mil, em valores atualizados.
Além da condenação dos acusados nas penas dos crimes de peculato, corrupção passiva e fraude à licitação, o MPF requer o pagamento da reparação do dano em R$76.297.168,65, relativo aos prejuízos causados à Valec.
Para mais informações, leia a íntegra da denúncia do MPF.