A jornalista Cileide Alves escreve a melhor análise sobre os 100 dias de governo Caiado. Ela consegue exprimir o sentimento de todos e mostra a falta de rumo da atual gestão. Leia a íntegra:
Quem é o Caiado governador?
O deputado federal e depois senador Ronaldo Caiado (DEM) é bem conhecido do eleitor goiano. Caiado revelou-se ao Brasil em 1986, aos 37 anos de idade, ao entrar em cidades montado a cavalo para participar de ruidosas manifestações ruralistas em defesa da propriedade privada, da ordem e da lei. Era o auge dos movimentos em defesa da reforma agrária e Caiado presidia a União Democrática Ruralista (UDR). Herdou da tradicional família Caiado, que comandou os destinos políticos de Goiás entre 1912 e a Revolução de 30, a altivez, a bravura e a contundência das opiniões e dos gestos políticos. Sempre foi um político de opinião forte, sem meio termo. Na eleição de 2018, eis um novo Caiado. Mostrou-se um político habilidoso. Atraiu para sua chapa parte importante do MDB e enfraqueceu o adversário Daniel Vilela. Pinçou da base aliada de Marconi Perillo (PSDB) seu candidato a vice-governador, Lincoln Tejota (Pros), uma jogada que, se não teve efeito eleitoral, mostrou que o candidato jogava para ganhar. Gabou-se de ter a sua volta a maior chapa, com 12 partidos. Queria mostrar-se um aglutinador, para contrapor sua imagem no meio político de desagregador, característica que não chega a atrapalhar um parlamentar, mas que é prejudicial a um chefe do Executivo. Por fim, apresentou-se aos eleitores como um candidato moderado. O Caiado explosivo, contundente, com seu conhecido sorriso cínico, deu lugar ao Caiado paz e amor. Na transição entre a vitória e a posse, o futuro governador manteve-se neste modelo. Articulou com empresários, governo tucano e Assembleia Legislativa a redução dos incentivos fiscais, do índice da receita anual destinada ao orçamento impositivo dos deputados e o Orçamento para 2019. Conseguiu uma raridade, refazer o Orçamento de seu primeiro ano de mandato, quebrando a regra de os eleitos governarem o primeiro ano com lei orçamentária escrita pelo antecessor. O sinal de que o script poderia mudar surgiu dez dias depois da posse. Em discurso em Jataí, sugeriu aos prefeitos da região que avalizassem as compras fiadas dos servidores públicos nas farmácias e supermercados porque atrasaria o pagamento do salário de dezembro. Na instalação da nova legislatura, em 15 de fevereiro, mandou beijos e fez coraçãozinho com as mãos para professores que protestavam contra o atraso salarial. Claros rompantes da era parlamentar. Os cem dias de governo, completados quarta-feira (10), é tempo insuficiente para prever o novo governo, mas satisfatório para perceber o perfil do governante. Assim, surge a pergunta: quem é o Caiado governador? A contundência para acusar Marconi Perillo de mau uso do dinheiro público e atribuir a seus governos tudo de ruim que acontece no Estado; a cansativa repetição do diagnóstico do estado de saúde Estado, que tentou sem sucesso internar na UTI do Programa de Recuperação Fiscal; o pouco interesse em apaziguar sua relação com servidores (à exceção do pessoal da segurança pública por quem demonstra diferenciado apreço), a demora em completar sua equipe; a falta de diálogo com o meio político goiano, em contraponto a sua extensa agenda em Brasília, indicam um Caiado com os dois pés em Goiás, mas com a cabeça e o coração no Congresso Nacional. Caiado está no governo, mas aparenta estar fora, em Brasília. Faz uma sincera defesa de mudança nos modos políticos, mas se perde na repetição de velhos modelos (os eventos, como entrega de viaturas em praça pública, e discursos sobre si e o suposto sucesso de suas ações em nada diferem dos eventos e autoelogios da era Marconi). Ao menos por enquanto, o governo não unifica ideias, projetos ou mesmo informações. Aliás, não é mera coincidência que o Power Point de 63 páginas com o balanço dos cem dias esteja rico em detalhes irrelevantes. É a falta de foco. Não me espanta, assim, que boa parte das análises feitas durante a semana apontaram à falta de norte do governo. Não será o governador que está sem norte?