Em editorial publicado neste domingo, o jornal Opção cobra do senador Ronaldo Caiado (DEM) explicações para o fato de ter recebido doações de empreiteiras que estrelaram a Operação Lava Jato, como Odebrecht, OAS e C. R. Almeida.
Abaixo, a íntegra do texto:
O empresário Marcelo Odebrecht, que corrompeu a República, deu um depoimento peremptório ao Tribunal Superior Eleitoral: “Duvido que tenha um político no Brasil que tenha” sido “eleito sem caixa 2. E, se ele diz que se elegeu sem, é mentira, porque recebeu do partido. Então, impossível”.
Que fique claro: há políticos que afirmam que não têm qualquer envolvimento com as empreiteiras sob alegação de que receberam dinheiro dos diretórios partidários. A “culpa” seria dos diretórios — não dos políticos. Se o dinheiro repassado aos diretórios, quase sempre nacionais, não era limpo, mas era entregue a políticos dos partidos, isto significa o quê? Que os políticos que receberam dinheiro dos diretórios estão, direta ou indiretamente, envolvidos com a corrupção.
Porém, do ponto de vista legal, nem sempre dá para provar isto, até porque, em certos casos, os recebedores estaduais nem sempre sabiam por quais motivos o dinheiro havia sido doado aos diretórios. Retenha duas palavras: “nem sempre”. Se os diretórios não pressionaram — alguém doa pressionando? —, e mesmo assim os políticos receberam grandes, médias ou pequenas fábulas financeiras, há mesmo o que explicar.
Marcelo Odebrecht frisou que, dos recursos destinados às campanhas eleitorais, quase 80% — exatos 75% — eram fornecidos “fora do sistema oficial”. “Caixa 2, para a gente, e eu acho que para todas as empresas, era visto como natural. Os valores definidos pelos candidatos eram tão aquém do que eles iam gastar que não tinha como a maior parte das doações não ser caixa 2. Era impossível.”
O pai de Marcelo Odebrecht, Emilio Odebrecht, em depoimento ao juiz Sergio Moro, acrescentou: “Existia uma regra: ou não contribuía para ninguém, ou contribuída para todos”.
Ronaldo Caiado e o diretório do DEM
O senador Ronaldo Ramos Caiado, de 68 anos, recebeu uma pequena fortuna do Diretório Nacional do Democratas, seu partido, na eleição de 2014, quando foi eleito. Ressalte-se que suas contas foram aprovadas pela Justiça Eleitoral e não se pode explicitar que tenha se envolvido com corrupção. Mas, ante o que disseram os dois integrantes da família Odebrecht e o que a Lava Jato revelou, o político goiano ao menos deve explicações mais detalhadas sobre o financiamento de suas campanhas eleitorais, começando por 2010, quando disputou mandato de deputado federal.
Segundo reportagem da revista “Veja”, assinada por Robson Bonin, Hugo Marques e Pieter Zalis — publicada sob o título de “PF encontra lista de políticos que receberam dinheiro de sócio de Bumlai”, em dezembro de 2015 —, o empresário Natalino Bertin, do Grupo Bertin, fez doações vultosas a vários políticos na eleição de 2010. O “parceiro de negócios do pecuarista José Carlos Bumlai”, ex-primeiro-amigo do ex-presidente Lula da Silva (PT), doou dinheiro a Michel Temer (MDB), então candidato a vice-presidente, Eduardo Cunha (MDB), Aloysio Nunes Ferreira (PSDB) e Ronaldo Caiado. A documentação resultou da Operação Passe Livre, parte da Operação Lava Jato.
Ronaldo Caiado teria recebido do Grupo Bertin, por meio das empresas Macleny Distribuidora e Orchiade, 500 mil reais. Mas o senador contrapôs, segundo a reportagem da “Veja”, que recebeu “apenas” 200 mil reais. Por que o então deputado federal do DEM não recusou a doação do frigorífico (ele, por sinal, notabilizou-se como crítico da cartelização dos frigoríficos)? A nota enviada pelo político goiano à publicação do Grupo Abril não explicita nada além do fato de que recebeu dinheiro, mas não o valor de meio milhão de reais.
Empresários, como Marcelo Odebrecht, disseram que davam dinheiro a políticos em troca de favores. Mas e os que não estavam no poder? Eles esclareceram que, um dia, poderiam ser eleitos para cargos executivos — com a possibilidade de serem liberadores de recursos financeiros. Não só. Mesmo no Legislativo, poderiam apresentar medidas para favorecê-los e, mesmo, pressionar aqueles que estavam no Executivo. Uma coisa é certa: ninguém dá dinheiro a políticos por causa de seus belos discursos ou por mera simpatia. Empresários, e não apenas os do ramo das empreiteiras, são pragmáticos e não jogam dinheiro fora. São “investidores”.
Odebrecht, OAS e CR Almeida
Em 2014, numa aliança com o MDB de Iris Rezende e Michel Temer, Ronaldo Caiado foi eleito senador com 1.283.665 votos — o equivalente a 47,57% (quase 53% optaram por outros candidatos, como Vilmar Rocha, do PSD, e Marina Sant’Anna, do PT).
Durante a campanha, Ronaldo Caiado recebeu recursos financeiros de várias empresas, ao menos três delas, a Construtora Norberto Odebrecht S.A., a Construtora OAS S.A. e a Construtora C. R. Almeida, foram e estão sendo investigadas pela Operação Lava Jato. Parte dos processos judiciais está com o juiz Sergio Moro, da Justiça Federal em Curitiba.
Os dados a seguir estão disponíveis na Justiça Eleitoral e podem ser conferidos pelos eleitores. Foram fornecidos pelo próprio Ronaldo Caiado.
Da Construtora Odebrecht, via Diretório Nacional do DEM, Ronaldo Caiado recebeu 400 mil reais — quase meio milhão de reais. Como em outubro de 2014 (data da eleição), a empresa já estava sendo investigada pela Lava Jato — operação iniciada em março daquele ano —, o presidente do Democratas, sabendo a origem dos recursos, poderia ter se negado a recebê-los. Porque aceitou-os, mesmo sabendo a origem, o senador nunca explicou a contento. Limpo, possivelmente, o dinheiro não era — considerando o que disseram Marcelo Odebrecht e Norberto Odebrecht.
A Construtora OAS, da Bahia e espraiada por quase todo o Brasil, doou dinheiro ao Diretório Nacional do DEM, que repassou quase meio milhão de reais (exatos R$ 499.400,00) a Ronaldo Caiado, em 2014. O dinheiro chegou via cheque. O senador teria como recusar o recurso? Por certo, sim. A OAS é uma das principais investigadas pela Operação Lava Jato e integrava o chamado Clube do Bilhão — que se comportava de maneira semelhante à Máfia.
A Construtora C. R. Almeida, também investigada pela Operação Lava Jato, deu dinheiro ao Diretório Nacional do DEM — que repassou 400 mil reais para Ronaldo Caiado.
Dinheiro da Transrio Caminhões, Ônibus, Máquinas e Motores Ltda. — 300 mil reais — também aparece na campanha de Ronaldo Caiado. O recurso foi repassado pelo Diretório Nacional do DEM. Sublinhe-se que a mesma empresa doou dinheiro para o presidente Michel Temer.
A Sama S.A. Minerações Associadas, produtora de amianto — um produto condenado internacionalmente —, doou 300 mil reais à campanha de Ronaldo Caiado. Também não se sabe por qual motivo a empresa investiu tanto no senador.
A Gerdau Aços Especiais S. A. doou 100 mil reais a Ronaldo Caiado.
O empresário e senador Wilder Morais (ex-PP, agora de volta ao DEM) doou 100 mil reais ao presidente do DEM. O Itaú Unibanco repassou 50 mil reais. Sandro Antônio Scodro, mais conhecido como Sandro Mabel, doou 10 mil reais (na verdade, não em dinheiro vivo, e sim na forma do uso de um helicóptero).
Maria Paula Lanat Suarez, mulher de um dos sócios da OAS, repassou diretamente à campanha de Ronaldo Caiado 300 mil reais. Por que uma empresária da Bahia decidiu investir quase meio milhão de reais na campanha de um político de Goiás? É uma explicação que, até agora, nem Maria Paula nem o senador apresentaram à sociedade.
Explicação necessária sobre doações
O Editorial está sugerindo que o senador Ronaldo Caiado é corrupto por ter recebido recursos financeiros, ainda que indiretamente, de empresas que se tornam célebres como corruptoras e são investigadas pela Operação Lava Jato? Não, de maneira alguma. O político tem uma história pessoal de lisura, não há nada que o desabone.
O que se está dizendo, sem subterfúgios, é que precisa explicar aos goianos (não apenas aos eleitores) por quais motivos recebeu dinheiro de empresas investigadas — insistamos, ainda que de maneira indireta — e por que não recusou-o. Como crítico rigoroso de seus adversários, espera-se que o presidente do DEM apresente-se e explique à sociedade por quais razões aceitou dinheiro de empresas investigadas pela Operação Laja Jato. Antes ou depois de eleito, Ronaldo Caiado prestou algum serviço para tais empresas? Não se sabe. Só ele pode dirimir as dúvidas da sociedade.